O lírio
Em uma manhã puríssima de Abril,
O mar beijava a aurora, o céu era de anil,
Dizia o melro à fonte alvas canções de amor.
Era suave a briza e os jardins em flôr.
Mas, entre as frescas côr’s das dálias e das rosas,
As aves perfumando as canções melodiosas,
Sonhava branco e triste um lírio imaculado.
Uma abelha passou e disse-lhe baixinho:
“Sobe comigo ao céu e piedade e carino
Apenas acharás nessa mansão divina.”
A flôr branca fitou a abelha pequenina
E ainda com dôr maior continuou sonhando.
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Abelhas infantis que passais doidejando
Por esse etéreo azul a respirar amôr,
Jamais conhecereis as penas duma flôr,
E nem mesmo no céu podereis encontrar
Um bálsamo de amôr que consiga minguar
Esse tormento infindo, esse pesar enorme.
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Uma violêta azul, imaculada e linda,
Conhecendo do lírio aquela dor infinda,
Mandou divina e humilde, a tremular de pejo,
Nas asas do perfume o soluçar dum beijo.
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O lírio divinal curvou-se p’rà florinha
E a palpitar de amor disse: “Violêta és minha.”
E já ouvi dizer a uma borboleta
Que não se aparta mais o lírio da violêta.
Simão Cordeiro,
in Gervásio Lima, Torneio Açoreano vol I,
Angra do Heroísmo, 1937.
Silveira, Simão Cordeiro Machado Maciel da (1910-1939), funcionário do Observatório Meteorológico, poeta e pianista, natural da cidade da Horta onde trabalhou e veio a falecer vítima de tuberculose.