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Este conteúdo fez parte do "Blogue Graciosa Online", que se encontra descontinuado. A publicação é da responsabilidade dos seus autores.
Imagem de As “caixinhas” americanas
Graciosa Online 03 abr, 2018, 14:21

As “caixinhas” americanas

Crónica de Victor Rui Dores

Naquele tempo a escola do Alto das Covas ficava situada no Largo Salazar. 

Os alunos daquele estabelecimento de ensino (e eu fui um deles) aguardavam, com impaciência, aquele dia especial. 
Nesse dia não havia preposições para decorar, não soletrávamos as sílabas, não reduzíamos metros a quilómetros, não aprendíamos as estações dos caminhos-de-ferro da linha da Beira Alta nem os afluentes do Cávado e até esquecíamos as reguadas e verdascadas do professor. Estávamos livres de tomar o óleo de fígado de bacalhau (era preciso apertar o nariz para engolir aquele líquido horroroso) e, na cantina, não tínhamos que comer aquele queijo americano, muito amarelo, que sabia a sabão… Não havia galhofa nem retoiço de recreio e o Picanço, por ser gordo e pitosga, não tinha que jogar à baliza… 
O nosso professor já nos havia avisado: 
-Meninos, amanhã venham todos bem ataviados. Tragam as batas brancas bem lavadinhas, os cabelos penteados, as unhas cortadas e não quero ver ninguém descalço aqui na escola, entendido? 
As “caixinhas” americanas-Sim, senhor professor! 
O referido dia era o da vinda de militares americanos à nossa escola. Vinham, uma vez por ano, fazer a filantrópica distribuição de umas apetecíveis “caixinhas”… 
As “caixinhas” eram, no seu exterior, vermelhas, azuis e brancas, com umas estrelinhas onde se podia ler: “People to people” e, no seu interior, continham lápis de cera (para nós, uma novidade naquela altura), vistosas bolas de berlinde, borrachas, lápis, canetas, guaches, caramelos, chewing-gums e chocolates… 
Precedidos do director escolar e de todos os professores, os americanos chegavam, delambidos e impecáveis, nas suas fardas e nos seus sorrisos rasgados e, curiosamente, não esfregavam os pés no capacho à entrada da escola… 
-Então, o que é que se diz, meninos? – perguntava-nos o director escolar. 
-Tanquiú! Tanquiú! – respondíamos à medida que, cheios de deslumbramento, recebíamos a tão aguardada oferta. 
-Os americanos são uns porras-tontas! – dizia o Picanço, meu companheiro de carteira, no seu jeito habitual de tirar mucosidades das narinas e colá-las no rebordo da carteira… 
-E uma chapada no focinho? – rosnou, entre dentes, o nosso indigesto professor, que, de passagem, ouvira a conversa. Picanço disfarçou, coçando a cabeça. 
Eu e o Picanço éramos grandes amigos, apesar de andarmos sempre pegados à tapona… Ele tinha lá a sua veneta, mas era rapaz de bom fundo. 
-All right, “camòniesse”… – gozava o meu parceiro naquele ódio de estimação que nutria pelos americanos, e isto porque, dizia-se, a mãe dele tinha sido desonrada, num saguão, por um sargento da Base das Lajes… 
-Tanquiú! Tanquiú!
……………………………………………………………………………………………………………… 
Nesse tempo, o quotidiano angrense era redondo e sonolento. Do Alto das Covas avistava-se São Jorge e o Pico em dias de céu despido. Havia um cheiro a maresia que inebriava. O polícia sinaleiro lá estava a dirigir tanto os automóveis que andavam a 20 km à hora, como as lesmíssimas carroças de carga… 
Rua da Sé abaixo, os nabiças, carregando cestos às costas, apregoavam: 
-Charrinho fresco, cavala grada, pueixe! 
Os vendedores ambulantes vendiam milho torrado, pevides, favas, caramelos rebuçados de alfenim e “malaguetas”: 
-Ora mais, ora mais, ora mais! 
Angra do Heroísmo era a sua baía mansa, o Monte Brasil, o Castelo, o Relvão, as casas nobres, as lojas, o Jardim Público, o Porto de Pipas, as camionetas do Largo do Prior do Crato, os engraxadores da Praça Velha e os degraus do Pátio da Alfândega… 
Nas ruas daquela “mui nobre, leal e sempre constante cidade” abundavam magalas, polícias e naiões. E não faltavam tabernas, cafés, pastelarias e repartições públicas. O Lusitânia rivalizava com o Angrense. Aos fins-de-semana, os “bandos de estorninhos” (seminaristas) passeavam-se aos pares pelas principais artérias da urbe e, a partir de Maio, o povo voltaria a ser festivo e festeiro…
……………………………………………………………………………………………………………… 
Ah, as delícias das “caixinhas” americanas… 
-Tanquiú! Tanquiú! 
(“Abençoada América que tantos favores nos fazes”, haveria de escrever mais tarde o poeta Santos Barros). 
– Então, Picanço, o que é que se diz a este senhor americano? – perguntou o nosso circunspecto professor, franzindo a testa. 
E o Picanço, fitando com altivez o militar, respondeu com um sorriso escarninho: 
-Foquiú, Joe! 




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