70 ANOS DA COMISSÃO ALAGOANA DE FOLCLORE
OLEGÁRIO VENCESLAU DA SILVA (*)
As multicoloridas fitas e apetrechos adornam o frontispício de reluzentes chapéus dos velhos Guerreiros, com suas imagens bucólicas refletindo a religiosidade comum nas igrejas e templos dedicados aos santos católicos, patronímicos de certa comuna nativista. A esta aquarela folclórica, pintada pelas mãos de lídimos mestres e senhores dos saberes populares, emanados do âmago do povo, se somam ainda estórias fictícias surgidas do imaginário lúdico de nossa gente, que há séculos traz consigo um legado de pertencimento cultural afro ameríndio e não menos lusitano, trazidos nos conveses e inóspitos porões das naus que cruzaram os mares nunca dantes navegados, cujos horizontes levaram-nos a destinos até então desconhecidos, atracando nesta terra de Santa Cruz.
Toda essa efervescência de tradições despontou em solo caeté, desde os longevos tempos, em que ainda éramos Capitania agrária e açucareira, nas primeiras décadas do século XVII. Neste interregno temporal não foram poucos os estudos, pesquisas e anotações, que eternizaram nas páginas amareladas de antigos jornais e livros as manifestações pitorescas da incipiente Alagoas, que aos poucos se desvencilhava e deixava o regaço de sua sempre terna mãe Pernambuco- sonho do Conde Maurício de Nassau.
No alvorecer da primeira metade do século XX [1948], cruzando vielas e becos de uma Maceió, banhada por lagoas e canais, encharcada pelos negrumes dos mangues abissais de Bebedouro e Dique Estrada, exalando o cheiro forte do sururu que alimentava sua gente, eis que entre estes despontam conspícuas personalidades, abnegados vultos que por anos a fio se debruçaram sobre a os estudos do folclore e suas matizes, nascendo, portanto a Comissão Alagoana de Folclore, precisamente no alvissareiro mês de maio.
Sob a batuta sempre firme do médico viçosense Théo Brandão, pupilo de seu tio paterno doutor Olegário Brandão Vilela, senhor do Engenho Mata Limpa, se aglomeraram em torno daquele uma miríade de outros estudiosos de escol, no afã de reunir conhecimentos, saberes, costumes e modos de vida do lavrador, vaqueiro, poeta, contista e tantas outras figuras enigmáticas do povo. Engrossaram a fileira de fundadores da Comissão Alagoana de Folclore- CAF, personalidades que merecem os mais vibrantes e sonoros aplausos, gravando nos anais da história seus nomes jamais olvidados, quais letras garrafais que desenham em traços oblíquos o mais finíssimo e inigualável mármore de Carrara: Abelardo Duarte, Sinfrônio Magalhães, Mário Marroquim, Luiz Wanderley Lavenére, Antônio Saturnino de Mendonça Braga, Gastão de Carvalho Souza, José Lages Filho, Maria Aída Wucherer Braga, Laurinda Vieira Mascarenhas, José Calmon Reis, Carlos Ramiro Bastos, Ezechyas Jerônimo da Rocha, José Aloísio Brandão Vilela, Paulino Rodrigues Santiago, Carlos Onildo Guimarães e Mário Hélio Gouveia, estes dois últimos fazendo parte do núcleo estudantil.
E no seu septuagésimo aniversário de criação, a Comissão Alagoana de Folclore tenta manter vivo o ideal de seus primeiros membros, cuja missão hoje abraçada por pouquíssimos continuadores dos estudos antropológicos e etnográficos é assegurar a perenidade desta entidade, guardiã das tradições culturais legadas pelos antepassados que aqui viveram.
*Advogado, membro da Comissão Alagoana de Folclore e Presidente da Academia Alagoana de Cultura.