TEXTO DE APRESENTAÇÃO DA EXPOSIÇÃO, ABERTA EM 15 DE SETEMBRO, NO CENTRO MUNICIPAL DE CULTURA EM PONTA DELGADA,ILHA DE SÃO MIGUEL.
“TEMPO NO TEMPO – No limiar de um novo ciclo”
Em Janeiro do ano passado quem aqui esteve ouviu-me certamente falar das circunstâncias em que me vi envolvido no papel de apresentador oficial da Exposição de um grande expoente da pintura actual, açoriano de alma que não de nascimento. Como se não bastasse uma vez, eu que de pintura nada sei, cá estou de novo, qual sapateiro atrevido além da dita cuja… Mas as coisas são o que são, e se o António Ferreira Pinto, de seu nome completo, me dirigiu novo convite para aqui estar, aqui estou, de alma e coração.
Os 26 anos passados em Angola marcaram uma fase da pintura de Ferreira Pinto que é bem patente nas cores fortes, nos temas escolhidos, nos traços bem vincados com que ele trabalhou os 4 elementos da natureza – ar, terra, fogo e água. Foi um tempo no Tempo para o qual o autor nos pretende despertar.
Em 1975 fixa-se nos Açores e na tela recria um outro tempo – a ilha, o místico, o fantástico – em todas as tonalidades do espectro do verde, mas com o tempo esta fase da vida proporciona-lhe outras experiências.
Aqui encontra o seu ancoradouro para zarpar rumo ao universo. É aqui que ele solta as amarras e desabridamente parte em busca do desconhecido. Quer ver para além da ilha, quer ver o outro lado, quer ver o outro tempo. Haverá outro tempo? O Tempo tem tempos? Ou será tudo um Tempo? O que é que há num tempo que não há noutro tempo mas que existe, sempre existiu e sempre existirá no Tempo? Ferreira Pinto procura as respostas e pretende partilhar connosco os resultados das suas lucubrações através da pintura. Elegeu um tema genérico que serve de pano de fundo para esta partilha – Tempo no Tempo. Genial, caro amigo António, agora que passaste a introduzir o 5º elemento na tua pintura – o éter. E é sob a égide do “Tempo no Tempo” que o autor compõe diversas temáticas, cada uma dedicada àquilo a que eu chamaria de “tempo no Tempo”.
Hoje Ferreira Pinto propõe-nos uma reflexão sobre o limiar de um novo ciclo. Comecemos então pelo próprio número de quadros que compõem a Exposição: doze. Para os numerólogos, 12 equivale a 3 que é o número da divindade. O três está sempre presente ao longo da obra – vejam que os quadros de um modo geral estão divididos em 3 planos, umas vezes de forma explícita, outras de forma mais subtil. Para os conhecedores das questões da espiritualidade, 12 lembra-nos o Portal 12:12, e o 3 assemelha-se muito ao símbolo do OM que representa a energia da Fonte Que Tudo É.
Em “Transcendendo o Espaço e o Tempo” (subtítulo da Exposição anterior), Ferreira Pinto procurou conduzir-nos para lá do nosso tempo e eis-nos chegados agora ao “limiar de um novo ciclo”. Para quem acompanha a tua pintura, que viagem fantástica esta! Se foi esse o teu propósito (e acredito que foi), então podes ficar ciente de que conseguiste. Aqui estamos nós no limiar.
Mas, no limiar de quê? De que ciclo nos queres falar António?
1987 Está bem explícito num dos quadros. Assim, sem mais. Não há dúvidas, poupaste-te a eufemismos. Não se trata de um evento familiar ou de outra data socialmente relevante. É mesmo 1987, o ano da Convergência Harmónica. É o princípio das grandes transformações planetárias a que nós estamos tendo o privilégio de assistir e mais do que isso, de participar activamente, se assim o quisermos, a escolha é nossa – a nada estamos obrigados nesta vida a não ser “escolher” – a cada escolha uma consequência. Mas falar em grandes transformações não necessariamente tem a ver com algo catastrófico. O próprio autor escreve num dos seus quadros: “o fim dos tempos foi cancelado”. Muito importante esta mensagem António, bem-hajas por isso. A humanidade está inundada de arautos da desgraça e de falsos profetas, imbuídos ainda no espírito que reinava num tempo anterior à transmutação que tem ocorrido um pouco por todo o planeta. Tudo existe dentro de nós. Temos de fazer espaço para acomodar a serenidade, quanto mais nos enchermos de tranquilidade menos lugar haverá para o caos. A escolha é nossa (mais uma vez a “escolha”). O fim dos tempos pressupunha o “fim do mundo” e muitas pessoas viviam e vivem ainda vibrando nesta energia. Pelo contrário, o autor quer transmitir-nos uma mensagem de serenidade e é por isso que nos conduz ao limiar de um novo ciclo. Começamos assim a desvendar o significado do subtítulo desta Exposição. O novo ciclo transporta-nos para um outro tempo no Tempo. As cores agora utilizadas – prata, amarelo, dourado entre outras, são aqui e ali pontuadas por pequenos pontos cintilantes, pequenos brilhantes que nos fazem finalmente ver a Luz. Este o novo ciclo, o ciclo da Luz, o ciclo duma existência que procura uma nova etapa nesta caminhada de retorno à Fonte Que Tudo É. Reparem como nos quadros que compõem esta Exposição o autor já não sublinha enfaticamente a dualidade caos / harmonia mas ao contrário propõe-nos uma visão mais serena da vida no eterno Aqui e Agora.
Percorremos os doze quadros e neles podemos ver a realidade do universo em toda a sua pujança – planos paralelos, linhas temporais sobrepostas, mundos mais densos e mundos etéricos, muitos caminhos (todos são possíveis, todos nos conduzem ao eterno) uns com mais espinhos, outros mais suaves – as escolhas, sempre as escolhas. Formas geométricas – o universo é feito da chamada geometria sagrada – formas de vida, algumas do nosso imaginário mas que existiram certamente em alguma parte num qualquer tempo, pirâmides que simbolizam a nossa inata ligação com o divino mas que estão ainda truncadas na parte superior porque a ela não temos ainda acesso no nosso grau de consciência, enfim uma imensidade de pormenores que nos levam a ficar em êxtase perante esta obra esmagadora com que Ferreira Pinto nos brindou no retorno de mais uma viagem pelo mundo da metafísica, a partir do ancoradouro da ilha.
Mas afinal, António, aonde foste? Deixa-me adivinhar, foste ao local mais longe e inacessível que existe no universo – o teu interior. Lá, onde não existe Tempo, no silêncio do teu EU, encontraste as respostas para a busca incessante a que te tens dedicado ao longo desta tua existência terrena. E quiseste partilhar isso connosco.
Obrigado, António. Bem-hajas!
15 de Setembro de 2011
Luís Rocha