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Imagem de Notícias do tempo em que Cabo Verde era
“o crâneo calvo de Deus”   JOÃO-LUIS DE MEDEIROS
Comunidades 01 nov, 2009, 14:42

Notícias do tempo em que Cabo Verde era “o crâneo calvo de Deus” JOÃO-LUIS DE MEDEIROS



Breve prelúdio
:

        Diria que o principiante no estudo da literatura cabo-verdiana depressa se deixa "cativar" pela proximidade dos autores mais destacados do Movimento Claridade, nomeadamente o consagrado escritor Manuel Lopes(*) que teve como companheiros das Letras & Artes, Baltazar Lopes e Jorge Barbosa.

          Esta breve conversa promete ser uma espécie de revisitação do romance  Os Flagelados do Vente Leste, um dos mais conhecidos trabalhos literários de Manuel Lopes, considerado como veículo de denúncia do calvário geo-sociológico dos ilhéus cabo-verdianos.

        Em rápida alusão comparativa, diria ainda que o açoriano cuja temática literária mais se aproxima da obra de Manuel Lopes, é porventura o escritor Dias de Melo, autor de Pedras Negras e de Mar pela Proa (entre outros).  

      Notícias do tempo em que Cabo Verde era
“o crâneo calvo de Deus”   JOÃO-LUIS DE MEDEIROS

1 –  … a aparente imutabilidade do destino  humano

          Talvez por ser cada vez mais complexo escolher plataformas consensuais para projectar os conceitos de ficção pura, o livro Flagelados do Vento Leste é uma interpretação neo-realista do segredo oculto nas noites vazias da saga da sobrevivência de um povo singular. O escritor Manuel Lopes apercebe-se, genialmente, de que a aparente imutabilidade do destino humano tem mais a ver com a alienação sistemática das vontades, do que com as arbitrariedades climáticas da geografia.

          O romance é inspirado no quotidiano da vida popular em Cabo Verde antes do advento da sua independência política. Manuel Lopes reconhece que os desígnios da geografia foram ampliados e perpetuados pelos condicionalismos impostos pela arrogância colonialista. Todavia a sua narrativa não precisa da bengala ideológica para se guindar às alturas da justiça. E como o seu discurso artistico não sofre da gaguez do medo, a realidade do seu tempo ainda nos chega com o travo d’aventura.

          Tudo se resume na espera da chuva no patamar do cadafalso ameaçador da fome que engorda a fé: a ameaça das calmarias de braço dado com a  lazeira do relógio da vida; a violência indiscriminada das lestadas é vista como desconto no rol dos pecados; o sentimento ilhéu embalado no trinado “fado-crioulo-coladera” promovido a hino-gemido regional de um povo sumido no seu desgosto claustral.

           Em breves pinceladas solidárias, aí fica a realidade trágica cuja secular imutabilidade o caciquismo lusitano fingia ignorar…

          

2 – Do Livro “Os Flagelados do Vento Leste”:

      – Grito de alarme? Denúncia? Elegíada do Ilhéu Cabo-verdiano?

           No prefácio do seu livro, o autor apressa-se a relembrar o comentário dum intelectual cabo-verdiano, segundo o qual, nos planos da natureza em relação àquelas ilhas, “não entrava, ao que parece, a existência humana“.

          Como fiel adepto e praticante do neo-realismo, Manuel Lopes não se limita a reportar aquilo que vê. O escritor raciocina o que sente, porque é conhecedor exímio do micro-clima, da topografia, dos recantos inóspitos do interior da ilha. Mais: sabe de linguística, da silhueta fisiológica dos famintos, da psicologia das almas mirradas pelo isolamento…

           Como que a desafiar o exclusivismo da tipocromia queiroziana, Manuel Lopes surge-nos como “criador de tipos“, comparando a coragem de uns com a pusilanimidade de outros: os que enfrentam o harmatão e os cornos dos fados, como Nhô Manuelinho, conhecido como o Ti Manelim, viúvo e velho; José da Cruz que, no seu delírio cíclico, sonha com anjos com baldes de água; João Felícia, símbolo da fraternidade na desgraça. (O romance também fala de gente malfazeja, como é o caso singular do Saltapedra, ou do famigerado Leandro cuja cicatriz física é a marca de “pecado original”). A aceitação tácita das balizas do destino impressiona vivamente o escritor, que coloca nos lábios de José da Cruz, o seguinte: “… o destino é um enviado de Deus. Quem vê escuro, para diante não vê nada.”  

          Manuel Lopes singulariza o falario dos ilhéus, durante o chamado  “tempo de cedura“. E, dado que é vital poupar o milho da sementeira, a frugalidade é quase uma religião: “homem direito não põe a boca na dívida sagrada, para não virar ladrão de Deus…” Além disso, Lopes fala-nos dos que, apostados na aleluia das chuvadas, têm de “semear pó“… sem esquecer o drama da maternidade não planeada – como é o caso daquelas mães solteiras que vão “desencabrestar” em casa alheia. Na solidão altaneira do interior da ilha os guardadores de gado “podem escutar as estrelas a crepitar, como lenha a arder, tão perto se sentem delas…“

           Como personagem contrastante pela sua presença aérea e quase vegetal, temos a professora Maria Alice: uma espécie de ambulância dos primeiros socorros ao analfabetismo endémico. Na sua dulce militância contra a ignorância, a professora Alice sonhava encher a cabeça de gente com estômago vazio. “A lua tem o poder de apagar umas coisas e acender outras” – escreve Lopes.

           … Um certo dia a alegria veio molhada. A chuva ensopou o chão! Agora, as bagas de água e as lágrimas de alegria são como irmãs gêmeas. O escritor avisa que era preciso saber esperar que “os olhos das plantas furassem a terra, para mandar os meninos retirar as pedras das covas”.  De agora em diante era preciso “governar o cinto da barriga conforme Deus fosse servido…”

——    

 

(*) Durante a II Guerra Mundial, Manuel Lopes viveu na cidade da Horta – Faial, tendo convivido com o poeta e escritor açoriano Pedro da Silveira.

João-Luís de Medeiros é natural da ilha de São Miguel, Açores, e vive nos Estados Unidos desde finais de 1980. Antes de emigrar, trabalhou no sector privado empresarial, e após a instauração da Democracia em Portugal, foi eleito parlamentar à Primeira Legislatura da A.L.R. (Horta, Faial, 1976); mais tarde, serviu como representante açoriano na Assembleia da República (Lisboa, 1978). As suas publicações em poesia e prosa estão dispersas algures em jornais e revistas da diaspora lusófona. Desde 1976, é colunista-convidado da imprensa comunitária (coluna Memorandum). É co-autor do livro Em Louvor do Divino (1993); recentemente, publicou o seu primeiro livro de poemas intitulado (Re)verso da Palavra (2007). João-Luís de Medeiros é licenciado ‘cum laude’ em Humanidades e Ciências Sociais (University of Massachusetts, Dartmouth); mais tarde, obteve o Mestrado em Ciências de Recursos Humanos (Chapman University, Orange, California).

 

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