A torre de Babel
I. O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa: motivação e evolução histórica
O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em Lisboa a 16 de Dezembro de 1990 pelos legítimos representantes dos então sete países independentes de língua oficial portuguesa, é constituído por um texto principal do qual constam as bases reguladoras desta reestruturação linguística e por uma respectiva nota explicativa.
De entre as principais razões e objectivos para a elaboração deste texto destacar-se-iam, tal como previsto no seu preâmbulo: a) o interesse em unificar a ortografia da língua portuguesa; b) o desejo de preservar a sua unidade essencial; c) a necessidade de promover o seu prestígio internacional.
Do ponto de vista histórico, foram estas mesmas motivações que, desde o início do século XX, instigaram, primeiro Portugal e o Brasil e, mais tarde (pós 25 de Abril de 1974), também as excolónias portuguesas em África, a procurar alcançar um acordo com vista a uma ortografia comum.
De facto, em 1911, dá-se em Portugal uma grande reforma ortográfica que todavia não se estendeu ao Brasil. Em 1915, a Academia Brasileira de Letras opta por aderir àquela reforma, mas revoga essa mesma decisão quatro anos mais tarde, em 1919. Em 1931, é aprovado um primeiro acordo ortográfico entre Portugal e o Brasil que, contudo, nunca chegou a entrar em vigor. Em 1943, 1945 e 1986 ocorreram novos encontros, aquele último já com a presença dos países africanos de língua portuguesa, mas, mais uma vez, sem quaisquer resultados práticos. Aliás, só em 1971 no Brasil, e em 1973 em Portugal, se verificaram iniciativas legais, bem como alterações linguísticas dignas de nota no âmbito da redução substancial das divergências ortográficas entre os dois países.
O actual Acordo representaria, assim, mais um instrumento, senão o último, com vista à harmonização ortográfica do Português. Como sabemos, porém, o seu processo de implementação sofreu variados reveses: 1) em 1998, através de um primeiro protocolo modificativo, e fruto do sucessivo atraso na adopção das medidas adequadas à sua real aplicação, foi decidido, pelos mesmos sete países, eliminar o prazo de 1 de Janeiro de 1993 para a elaboração de um Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa – instrumento então considerado fundamental para a segurança e certeza linguística da nova ortografia – e, ao contrário do que se encontrava previsto no seu artigo 3º, estabeleceu-se ainda que a entrada em vigor do Acordo já não seria o dia 1 de Janeiro de 1994, mas sim uma data posterior ao necessário depósito junto do Governo da República Portuguesa dos instrumentos de ratificação de todos os Estados signatários. 2) em 2004, e visto que o documento assinado 14 anos antes ainda não tinha produzido nenhum efeito, pois ainda não tinha sido ratificado por todas as partes contratantes, procedeu-se, através de um segundo protocolo modificativo, a uma nova alteração do artigo 3º pela qual se decidiu que para a sua entrada em vigor seria suficiente a ratificação, não por todos, mas por (apenas) três dos Estados signatários. Por fim, acrescentou-se ainda um último artigo no qual se permitia a adesão de Timor-Leste, Estado que entretanto (em 2002) tinha alcançado a independência.
Actualmente, e após ter sido ratificado pelo Brasil, Cabo Verde, Portugal e São Tomé e Príncipe, o Acordo encontra-se legalmente em vigor nestes países, todavia, e em consequência das dificuldades inerentes à sua implementação, com excepção do Brasil que já está a viver um período de experimentação linguística, os outros três signatários ainda não estabeleceram qual o prazo dilatório mais adequado para a sua efectiva aplicação. Quanto a Angola, Guiné-Bissau, Moçambique e Timor Leste, (ainda) não há qualquer manifestação a este respeito e, portanto, o Acordo não faz parte da sua realidade ortográfica.
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