Com o passar dos anos, a pompa e a intensidade da celebração da Festa foram diminuindo,sofrendo variações locais motivadas por fatores religiosos e sócio-econômicos. A tradição adentra o século XX enfraquecida, principalmente, no que tange a realização de festas populares junto aos atos litúrgicos, pois em muitos lugares os folguedos prevaleciam sobre as cerimônias de caráter religioso. Tão é verdade que, em 1905, Dom Duarte Leopoldo e Silva, bispo de Curitiba com jurisdição sobre a Província de Santa Catarina, em visita Pastoral ao Estado se pronunciou sobre a necessidade extinção da festa em decorrência dos folguedos profanos, especialmente, as folias que nada tinham de sagrado. A população não só de Desterro como também das outras localidades do litoral catarinense se revoltaram e não aceitaram a interferência intempestiva do Bispo e a Festa continuou sendo realizada. Anos mais tarde, nova proibição e intromissão direta da Igreja na celebração do Espírito Santo causou grande indignação. Desta feita, a ordem partiu de Dom Joaquim Domingues de Oliveira, Bispo Diocesano de Florianópolis, que proibiu o peditório da Bandeira. Noticiada a determinação pela imprensa catarinense a mesma causou surpresa e uma reação de rebeldia em toda parte.
Mas, a festa não desapareceu e continuou sendo realizada sempre com grande devoção e fé pelos populares e Irmãos, mantendo-se incólumes os seus ritos tradicionais até 1983.
Sobre os tempos de antanho, relata com muita graça e humor desconcertante, no seu estilo refinado de falar do nosso cotidiano e tradições, o escritor Sérgio da Costa Ramos na crônica “Vôo da Pombinha,” publicada em sua coluna, no jornal no Diário Catarinense (edição 7074 de 27/8/2005):
“ (…)As barraquinhas do Divino, ali da praça Getúlio Vargas, faziam parte do calendário social da cidade. Era a oportunidade de namorar a céu aberto, fora do baile ou do cinema. Depois da arenga daquela visita domiciliar – em que minha avó recolhia o “óbolo” ao Divino e nos convocava ao rito (“venham beijar a pomba”!) – acontecia o melhor: as barraquinhas, os namoros, as prendas arrematadas para fazer presente a alguma ‘querida’.
Os leilões corriam ao pregão de um profissional experiente, que aprendia a ler os olhares e até sabia para “quem” o mimo estava sendo arrematado. As pequenas prendas corriam ao matraquear das roletas, para que fossem sorteados os estojos de sabonetes Eucalol, ou as embalagens do perfume Dirce, logo ofertados a “alguém”, alvo de alguma paixão sincera, ou ‘malina’.(…)”
Nos treze anos seguintes a Festa entrou em declínio e os festejos populares deixaram de ser realizados. No ano de 1996, de 23 a 26 de maio, a Festa voltou com toda força da tradição com a efetiva adesão da população de Florianópolis. A cidade toda se mobilizou, revelando um sentido de união muito forte e a certeza que a Festa retornava para ficar,resgatando uma das maiores tradições de nossa terra.
A jornalista Juliana Wosgraus na sua coluna do Jornal Diário Catarinense, edição de 11 de maio de 1996, publicou a seguinte nota:
“ Divina Festa do Divino
(…) vai agitar a Praça Getúlio Vargas,ao lado do Corpo de Bombeiros,em
Florianópolis, de 23 a 26 próximos. A Irmandade do Divino Espírito Santo
está resgatando a festa que já existe há 223 anos, mas que ultimamente
estava restrita aos atos litúrgicos. Que, já levaram inúmeras famílias para
a praça e está na memória e raízes da cidade”
Aldírio Simões, jornalista, de saudosa memória, assim publica na sua coluna “Fala Mané”, no Jornal A Notícia, no A.N.Capital, na edição de 24 de maio de 1996, ele que era um “ manezinho” de Canasvieiras e defensor ferrenho da cultura da Ilha, a crônica “A Festa do Divino”:
“Quermesses com barraquinhas, oferecimentos musicais e o espoucar de
foguetes sempre foram um forte atrativo para o povo de Florianópolis.(…)
Para resgatar todo este folclore com a cara da ilha, assim como o forte
referencial religioso, a cidade conta com o retorno da tradicional Festa
do Divino Espírito Santo na Praça Getúlio Vargas, aberta ontem à
noite, depois de uma inatividade de 13 anos.(…)
Vejo o retorno da Festa do Divino, na chamada praça dos Bombeiros,
com os olhos de menino, assim como muita gente de minha época,
tenho certeza.”
Para completar, o cronista Sérgio da Costa Ramos em sua coluna no Diário Catarinense, na edição de 28 de maio de 1996, na deliciosa crônica “Barraquinha do Divino” assim expressou a sua satisfação pela tradição revivida:
(…)Toda essa festa acaba de ser revivida, o que é digno de sincero regozijo.
Ressuscitaram, também,as Barraquinhas do Divino, forma adaptada do ‘leilão
de prendas’ de que nos fala a tradição.
Aleluia. As ‘ barraquinhas’ do Divino,ali, na Praça Getúlio Vargas, junto à
Igrejinha do Espírito Santo, fazem parte do meu mais caro e prezado
‘pout-pourri’ de lembranças infanto-juvenis. (…)
Desta maneira, a partir de 1996 a tradicional Festa do Divino Espírito Santo, na Praça Getúlio Vargas foi revitalizada e a cada edição se expandiu exigindo uma maior organização e conquistando a posição de ser um dos maiores e mais concorridos eventos da cidade de Florianópolis.
A cada ano, quando chega o tempo de Pentecoste, a pombinha do Divino Espírito Santo, que representa a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, “asperge pela praça poções mágicas de paz e de saudade, sobrevoando a mais doce memória da cidade e abrindo as asas para o futuro, que, afinal, ao Divino pertence” afiança em doce prosa o cronista Sergio da Costa Ramos ao fecho da “Divina Tradição”, crônica publicada na edição de 28 de maio de 1998 no Jornal Diário Catarinense.
A expansão da Festa do Divino Espírito Santo e a iniciativa da Irmandade serviu de exemplo para outras comunidades da Ilha e do continente que passaram a dar mais atenção a organização do festejo e buscaram uma nova motivação e criatividade salvaguardando a sua memória cultural e evitando que enfraquecesse a sua manifestação.
Afinal, é tempo de Divino outra vez!
Florianópolis,19 de maio de 2010
* Fonte: Capítulo II: A Festa em Florianópolis in: Caminhos do Divino,Um Olhar sobre a Festa do Espírito Santo em Santa Catarina,2007
** Créditos Fotos e Legendas:
1. Assessoria de Comunicação Social,FCFFC,Dieve Oehme
2. Cortejo Imperial,IDES(2008), Jair Cepa
3. Cortejo Imperial,Rio Vermelho(2009) Marta Cecília Teixeira
4. Abertura Ciclo Divino(2010),L.Nunes
5 e 6. Procissão das Coroas e Bandeiras das Comunidades (2010),Jair Cepa
7. Bandeiras do Divino(2010), S.Nunes
8. Casal Imperador,IDES, década de 60.
9 Cortejo Pântano do Sul(2003),S.Nunes