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Em síntese, Cecília Meireles, poeta da diáspora açoriana, marcou a literatura portuguesa, sendo assinalável a sua fortuna literária, sobretudo entre os anos trinta e final da década de sessenta. Na verdade, esta grande notoriedade enraíza-se no facto de ela transcender “as suas raízes históricas, integrando-se num espaço amplo e universal (…)” (Gouveia, 2000, p. 17). Para além disso, a sua poesia é habitada, quer por um tempo imerso na subjectividade, quer pela dialéctica do efémero e do eterno.
Embora, actualmente, talvez um pouco esquecida pela crítica literária portuguesa, a sua poesia, ainda é (felizmente) estudada, na disciplina de Português, no Ensino Básico e Secundário. Além disso, é possível vislumbrar os ecos “cecilianos” na obra de poetas portuguesas bastante prestigiadas, como é o caso de Natércia Freire, entre outras.
Importa frisar que o que os “caminhos” da luso-brasilidade” se alicerçam no conhecimento detido pela autora acerca de Portugal e vice-versa, enraizados na comunhão entre duas literaturas irmanadas pelo idioma, mas também pela cultura e a História.
Por outras palavras, a obra de Cecília Meireles assume-se como uma ponte, ou melhor, um cais, onde duas culturas desaguam e harmoniosamente se encontram. Assim, nesta autora de dimensão universal, o mundo é reinventado através da dinâmica e da musicalidade da palavra, pois como escreveu: “a canção é tudo: /teu sangue eterno/ a asa ritmada”. Deste modo, esculpiu na sua escrita, além-tempo e além fronteiras, uma inquietude lírica, convertida em canto alado imaterial. Uma melodia, encantatória, tecida no “Verbo”, pura, densa, cristalina (como o mar dos Açores), onde ecoam as sombras dos antepassados, que, à semelhança de todos os açorianos que partiram, puseram o seu “sonho num navio e o navio em cima do mar.”
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Dora Nunes Gago é professora, doutorada em Línguas e Literaturas Românicas Comparadas, investigadora de pós-doutoramento da FCT, na Universidade de Aveiro. Publicou: Planície de Memória (poesia, 1997); Sete Histórias de Gatos (em co-autoria com Arlinda Mártires), 1ªed. 2004, 2ª ed. 2005; A Sul da escrita (Prémio Nacional de Conto Manuel da Fonseca, 2007); Imagens do estrangeiro no Diário de Miguel Torga (dissertação de doutoramento), Fundação Calouste Gulbenkian/FCT, 2008.
Além disso, tem poemas, contos e ensaios em diversos jornais, revistas e antologias. Tem apresentado igualmente diversas comunicações em Congressos Internacionais em Portugal e no estrangeiro.