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Este conteúdo fez parte do "Blogue Comunidades", que se encontra descontinuado. A publicação é da responsabilidade dos seus autores.
Imagem de (IM)PRÓPRIO DE MAIO
Urbano Bettencourt
Comunidades 13 mai, 2011, 11:57

(IM)PRÓPRIO DE MAIO Urbano Bettencourt



(im)próprio de Maio

No 1.º de Maio da infância, púnhamo-nos a pé muito cedo. Se o sol nos apanhasse na cama, entrava-nos no corpo e deixava-nos molengões, preguiçosos, para o resto do ano.
Esse já não era o Maio de favas e giestas que deu a Vitorino Nemésio o tom para a crónica do Jornal do Observador (18.5.1972) em que as moças da Praia e a sua lembrança convivem, tu cá, tu lá, com a alta poesia de Afonso X, o Sábio. E também não era ainda o “Maio social” que em 1976 lhe foi pretexto para o belíssimo poema “Maio de Minha Mãe”, recolhido em Sapateia Açoriana e que um crítico lisboeta referiu como um dos grandes poemas portugueses da década de 70: mestria poética e ironia sagaz subvertem planos temporais diferentes e os signos de algum discurso político dominante e submetem tudo isso ao império avassalador da evocação lírica de uma adolescência terceirense aí por 1918.
Em meados do século passado, o 1.º de Maio da infância não era nada disso. Ficava-se por um modesto Maio laborioso (nada operário, muito menos proletário, que a tanto não chegava a semântica familiar), consciente apenas, e já não era pouco, do esforço associado ao labor de cada dia.

No 1.º de Maio de 1974, a época seca aproximava-se angustiadamente do fim na Guiné-Bissau. As buganvílias floresciam sob uma intensa camada de poeira alaranjada. E não havia cravos. À noite, o PAIGC lançou um ataque maciço de artilharia contra Bissorã, cobrando-nos com juros altos o facto de ter sido através da sua rádio oficial que, durante o dia 25 de Abril, fôramos sabendo notícias da revolução em Lisboa. O nosso 25 de Abril só chegaria, aliás, a 13 de Junho. Neste dia, uma unidade de combate do PAIGC apresentou-se na pista de aviação, sob um rigoroso aparato militar que daria lugar ao convívio com a população e com a tropa portuguesa e a africana que combatia do lado português. Era o reencontro de um povo consigo mesmo. E descobríamos, enfim, que o inimigo, esse outro de cada um de nós, tinha um rosto e um corpo tangível, era possível fitarmo-nos directamente, sem o filtro do ódio e da raiva, sem a mira interposta das Kalashes e das G3. Motivos de sobra para um curto poema que chegou a conhecer publicação.
No 1.º de Maio de 2007, muitos anos depois da inocência, dou por mim ainda a organizar as fotos desse tempo, tentando pôr um pouco de ordem nalgumas sombras interiores e afectos. Enquanto isso, vou ouvindo Adriano Correia de Oliveira. O cantor é hoje vítima da amnésia militante desta democracia de plástico & esferovite, presumida e politicamente muito correcta, em que alguns abutres (jagudis, em crioulo guineense) nos espreitam de novo lá de cima. Ouço a voz magoada de Adriano, neste 25.º ano após a sua morte, percorrendo a música tradicional açoriana, os poemas de Manuel da Fonseca e de Rosalía de Castro. Mas detenho-me na “Canção com Lágrimas”, de Manuel Alegre: Eu canto para ti um mês de giestas / Um mês de morte e crescimento ó meu amigo / Como um cristal partindo-se plangente / No fundo da memória perturbada.

Nesse dia 13, que não sei se terá sido sexta-feira, Cabá Santiago (comandante de uma companhia de milícias pró-portuguesas) deixou-se fotografar ao lado de alguns combatentes do PAIGC. Deveria haver nesta foto mais alguns sorrisos, para lá de um ou outro esboço que parece morto à nascença e em contraste com as fotos em que militares, combatentes e população se misturam em convivência? Talvez, mas este é o ponto de vista (o meu) de quem, naquele momento, via a história a partir de um terceiro ângulo, apesar de tudo já em distanciação. Afinal, esta pose que não disfarça algum constrangimento era já um prenúncio do que estava para acontecer. O Cabá seria assassinado após a independência, um dos milhares de guineenses que tiveram o mesmo destino, entre eles o cozinheiro a quem devo uma parte da minha sobrevivência física. Tivesses-me envenenado, ó Zé Manjaco, e hoje serias herói nacional!

Lamentavelmente, não conseguirei desescrever esse poema de 13 de Junho, vindo do futuro à procura de um presente ainda por haver.
Urbano Bettencourt
(1/5/2007)

foto de Eduardo Bettencourt Pinto

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