Poema
Vim da escola no meu cansaço,
e vim porque afinal a rua me seguia,
como se fora a minha sombra
ou a cadência do meu passo.
Era noite e as estrelas,
em sensações perdidas
tinham janelas
que se fechavam na vidraça,
só de vê-las.
O resto é como quem passa:
olhando um cão vadio,
a montra duma loja,
ouvindo a sirene dum navio
e, indiferente,
esconder na algibeira
a própria alma
ou a cigarreira.
A rua tem uma curva
e vive na minha alma a curva do horizonte
que a sirene do navio me fechou
e vive o pesadelo de me trazer
amachucado no destino
de me supor antigamente
e vive um papel proscrito
na minha alma de sempre
e vive tanta coisa na minha algibeira,
onde guardo o horário da escola,
a caneta a riscar um grito
e a cigarreira.
Jacinto Soares de Albergaria, Atlântida, União Gráfica Angrense, Angra do Heroísmo, Julho / Agosto, 1959.
Jacinto Soares de Albergaria (1928-1981), professor, poeta, nasceu na cidade de Ponta Delgada onde trabalhou, residiu e faleceu.
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