Verdade e fantasia
Quando buscamos a fruição de uma obra de arte, somos movidos não apenas pelo desejo do prazer estético mas também (e às vezes sobretudo) pela necessidade de satisfazer a curiosidade que a vida, o mundo, os sentimentos nos causam, na tentativa constante de compreender e dar conta do real. Desde logo, não adianta negar, labor só parcialmente frutífero, pois quanto mais pensamos saber, e a prática é disso o melhor juiz, mais ficamos cientes do quanto não sabemos, parafraseando o filósofo.
As várias escolas literárias, filhas de seu tempo, tiveram e têm variada maneira de abordar a tragicomédia humana. Houve entre nós um tempo macabro em que se arrancavam das pessoas confissões verdadeiras ou não; sem analisar a triste parecença, muitos exigiam dos escritores, naqueles anos de chumbo da ditadura civil-militar, que só se alimentassem do real, deixando de lado a imaginação e o sonho, que nos incitam a andar. Hoje a obediência aos gêneros já não é exigência basal, e a história literária está cheia de exemplos.
É motivo de alegria este livro, em que os escritos de Salim Miguel (que cada vez mais permite a entrada do fantástico ou fantasioso em sua obra, em que o realismo prepondera) são enriquecidos com os trabalhos sensíveis e prenhes de significado de nosso excepcional artista Tércio da Gama. Os textos são a prova provada de que ter aprendido com a vida não o impede de imaginá-la e sonhá-la sempre mais fraterna e valiosa.
Eglê Malheiros
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Crédito Foto: Paulo Sérgio Miguel