DEONÍSIO DA SILVA : CATARINENSE MAIS ILUSTRE, IMPOSSÍVEL!
Você já ouviu falar de Deonísio da Silva? Você já ouviu a expressão “A retirada de Laguna?” O que será que uma coisa tem com a outra? Vamos começar pela segunda: a “A retirada de Laguna” é um livro escrito pelo Visconde de Taunay no século XIX, sobre um episódio da Guerra do Paraguay. Eu li esse livro na adolescência, mas lembro dele pouco mais que a terrível sede que sentiam os soldados brasileiros assolados pelo cólera-morbo, sede essa que só podia ser saciada por umas poucas laranjas existentes. Segundo o Visconde de Taunay, nossas gloriosas tropas retiraram-se de Laguna (uma lá do Paraguay) vitoriosamente.
Mas você já ouviu falar de Deonísio da Silva? Não? Bem feito! É um dos mais ilustres catarinenses que já produzimos, e Santa Catarina nem se lembra que ele existe. E você já ouviu falar no “Prêmio Casa de las Américas”? É, sem dúvida, o maior prêmio concedido nas Américas a um escritor. Tem uma versão em espanhol e uma em português, e jurados de verdade, como Saramago, por exemplo: é prêmio sério, nada tendo a ver com certos prêmios de cartas marcadas que costumamos ver por aí.
O que tem uma coisa a ver com a outra, no entanto? Tem que o Deonísio da Silva é um catarinense, nascido quase nas bocas das minas de Siderópolis e criado quase nas roças de Jacinto Machado, alfabetizado por D. Edite Zanatta e sabendo muito bem o que é poluição de mina de carvão, exclusividade nossa de Santa Catarina. Por sorte, eu tive o prazer de tê-lo conhecido quando ainda tinha 60 cm de cintura, na época em que amávamos aos Beatles e aos Rolling Stones. Como meu espaço aqui é pequeno, vamos logo saber mais coisas: Deonísio começou pelo Seminário de São Ludgero e terminou como Doutor em Letras pela USP – quer dizer, terminou não, porque não há término para alguém como ele. Eu estou toda boba, aqui porque vai sair meu 14º livro, e Deonísio já publicou 30; se fui traduzida para uma linguazinha ou outra, Deonísio já o foi para as mais importantes; se um livro meu quase virou novela das seis da Globo, Deonísio têm às pencas peças de teatro, adaptações para cinema e televisão, e tudo o mais que vocês imaginarem. Onde ele publica toda a semana? Nos mais diversos lugares, que vai desde o Jornal do Brasil até a Revista Caras, aquela que a gente lê quando vai no médico. Podem olhar que até lá o Deonísio está! (Vai ter muita catarinense “chique” adorando tal informação!)
Bem, e o Deonísio papou, bem na frente de todo o Brasil, o “Prêmio Casa de las Américas”, em 1992. Pena que ele não transformou o valor do prêmio em dólares, naqueles tempos de inflação, para a gente saber hoje quanto foi que ganhou; mas foi o equivalente ao salário de 36 meses de um médico. O livro? “Avante, soldados, para trás!”, vai contar, sob nova ótica, a Retirada de Laguna, aquela do Visconde de Taunay, só que desta vez de uma forma real, não heróica, e quando estive no Paraguay, agora em Janeiro, deitada dentro de uma trincheira de Lomas Valentina, lugar onde houve uma batalha com 100.000 mortos (quase todos brasileiros), como me era forte na lembrança o livro do Deonísio! “Avante, soldados, para trás” saiu em espanhol com o título de “Adelande, soldados, atrasa!”, e de cara vendeu 20.000 exemplares. E não podemos esquecer que o júri de tal prêmio, naquele ano, foi presidido nada mais nada menos que por José Saramago. No Brasil, o romance já vendeu sete edições sucessivas e também passou dos 20 000 exemplares. Em Santa Catarina, não sei. Porque quase ninguém em Santa Catarina nem sabe que têm um conterrâneo assim ilustre. Deonísio vem, anda por aí, bebe nos bares, escreve correndo suas colunas para os jornais dos grandes centros num notebook, em qualquer mesa de restaurante, e ninguém dá bola. Estamos todos muito preocupados com os nossos umbigos. Quando é que pode nos passar pela cabeça que um cara que foi “Prêmio Casa de las Américas” , personalidade mundial, pode estar a respirar o mesmo ar que a gente? E olhem que ele é bonitão, mulheres, charmoso! Fiquem de olho! E Santa Catarina não se anima a dar a ele nem o título de Filho Pródigo, o que, com certeza, ele não é.
Urda Alice Klueger
Blumenau,Santa Catarina
A autora Urda Alice Klueger, é natural de Blumenau,SC. Historiadora,romancista com uma vigorosa obra literária com duas dezenas de livros publicados e uma vasta colaboração em revistas e periódicos no Brasil e no exterior. É membro da Academia Catarinense de Letras.