O MASTHODONTE *
O sol em braza, ao longe no occidente
Desmaiado dardeja!
O torvellino varre o areal ardente,
Como faminta fera que fareja!
Onda apoz onda no dezerto agita,
D’um nimbo atro e poento o ár povôa;
Tal, por sobre a cidade impia e maldita
O flagello de Deus rapido vôa!
Mostra o simun de ingente masthodonte
Alva, gigante ossada!
Do sol que luz na extrema do horisonte
Jórra atravez luz palida, coáda!
Como as cavernas de galera enorme
Arroja o mar ao areal deserto,
O vento ergue o sudario do que dorme,
Faz do ranger do[s] ossos um concerto.
Teóphilo Braga,
Tempestades sonoras **,
Porto, Em Casa da Viuva Moré – Editora,
1864.
Joaquim Teófilo Fernandes Braga (1843-1924), escritor, político, poeta, nasceu em Ponta Delgada, ilha de S. Miguel, viveu e trabalhou em Lisboa, onde faleceu.
* Mastodonte – Espécie de elefante pré-histórico.
** A modernidade de Tempestades Sonoras e Visão dos Tempos, de Teófilo Braga, e Odes Modernas, de Antero de Quental, provocou a ‘Questão Coimbrã’ (1865) que há de celebrizar a ‘Geração de 70’.
(Foto: Museu de História Natural de Roterdã/Remie Bakke)