Bal du moulin de la Galette (1876)
Pierre-Auguste Renoir (1841-1919)
ANDAR À MODA
Eu tive um tempo que sonhei co’a gloria,
Tive ainda um outro que vivi d’amor,
Depois, mais tarde – se me lembro bem…
Fui desgraçado e chorei de dôr!…
A glória?! – Historias! Uma cousa velha
– Ou talvez antes um phantasma vão! –
É bem verdade que eu sonhei com ella,
Mas é bem certo que era tolo então!
Hoje, a glória quereis saber qual é?
– É mover bem da fortuna a roda,
– Que a outra gloria dos antigos tempos,
É traste velho, que passou da moda.
Vêdes um typo rechonchudo, parvo,
Co’uma comenda? – Já pertence á historia!
Nem sabe ler; foi talvez negreiro;
Mas tem uns contos: – Eis aqui a gloria!…
O amor?! – Outra cousa velha,
Que, hoje, ninguém sabe que feitio tem!…
Como a gloria dos antigos tempos,
O pobresinho se finda também!…
Foi forte outr’ora, nos diz hoje a historia,
E teve imperio sobre o mundo inteiro;
Mas hoje – coitado! – esmagou-o a moda,
Metendo-o em guerra com el-rei – Dinheiro.
E hoje o amor, que por mil poetas
Milhões de vezes foi cantado já,
É como um traste que se põe em praça
– Possue-o sempre quem mais ouro dá…
Á vista d’isto, vou sonhar com ouro,
Entoar hymnos da fortuna à roda,
Pôr a gloria e o amor de parte…
E escrever d’isto – para andar á moda…
Manuel Henrique Dias, Harpejos,
Lisboa, Tip. Eduardo Roza, 1889.
Manuel Henrique Dias (1867-1902), jornalista, poeta, natural da freguesia de Cais, ilha do Pico, aí trabalhou, residiu e faleceu.