Cem anos de gozação
Nunca houve velório igual ao de ontem no Mineirão. Não houve jogo. Só um time entrou em campo – o outro era um espectro de si mesmo.
O que aconteceu com os nossos craques estrelados? Não parece haver consolo possível para a tarde nervosa e trágica – este sim, um autêntico “Mineirazzo” perante quase 70 mil pessoas.
Para o Brasil, não foi uma semifinal. Foi uma Missa de Réquiem, rezada em intenção de uma alma desorientada. Nunca houve na história do futebol um duelo entre forças supostamente equivalentes em que um dos litigantes tenha feito cinco gols em 18 minutos. O Brasil saiu de campo e entregou o “latifúndio” ao adversário. Com os nervos à flor da pele, perdeu para si mesmo.
Eram aqueles os “guerreiros” que prometiam “lutar por Neymar”?
Sinistra não foi a derrota: foi o vexame. Levar tantos gols em tão poucos minutos foi como se fôssemos aquele time do Taiti, que levava 10 gols em meia hora. Aos trinta minutos de jogo, temi por um placar de basquete. O “onze” brasileiro vagava em campo como os zumbis do Incidente em Antares, de Érico Veríssimo. Os insepultos saíram de suas tumbas e foram assistir a uma retreta no coreto da praça.
Na tarde de ontem, nem houve oportunidade de torcer. “Os mortos em campo”, diria Nelson Rodrigues, eram “falecidos por vocação”. Tivemos vontade de lhes enviar coroas de flores e lhes atirar uma última pá de cal.
Entre os insepultos, destacavam-se Fred, Dante e Felipão. Fred foi o [artilheiro às avessas], inútil. Dante trouxe o “inferno” para a defesa. Felipão dormia no banco, perplexo. Tornou-se o maestro do maior “apagão” do futebol brasileiro.
No segundo tempo, virou pelada de várzea bem combinada: cinco vira, sete acaba.
Gabriel Garcia Márquez está convocado, lá do Céu, para escrever o romance da grande humilhação: chamar-se-á “Cem anos de gozação”.
Pior: esta Seleção não poderá sequer desfazer-se. Voltará à concentração para velar a si mesma, presidir o próprio velório e disputar outro pesadelo, o do terceiro lugar…
Foi como se fôssemos todos o Brás Cubas de Machado de Assis, aquele que, fora do corpo, levitando, assistiu ao próprio velório.
Não queríamos o “Hexa”? Fizemos mais do que o “Hexa”. Levamos um “Hepta”.
Sinto inveja da pequena humilhação que foi o 2 a 1 contra o Uruguai, no Maracanã de 1950.
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