Identidade, valores, modernidade: o meu livro sobre o pensamento de Onésimo Teotónio Almeida
Por João Maurício Brás *
O livro Identidade, valores, modernidade. O pensamento de Onésimo Teotónio Almeida, (Gradiva, 2015) apresenta o pensamento ensaístico e filosófico desse autor.
Em 2010 conheci Onésimo Teotónio Almeida (OTA) num encontro organizado pelo Centro de Literaturas Culturas Lusófonas e Europeias em Lisboa. Por ignorância minha, desconhecia por completo o seu trabalho. Esse encontro aguçou a minha curiosidade e levou-me a descobrir ao longo destes anos uma obra vasta e um pensamento fundamental. Este encontro tem respondido de modo único a algumas das minhas principais interrogações.
Estudei filosofia, e tenho sempre presentes a boas conversas com o meu orientador de Mestrado e Doutoramento, o filósofo Fernando Gil. Eram suas preocupações reiteradas a falta de pensamento crítico em Portugal, a ausência de uma tradição filosófica consolidada, a fraca receção do que se faz “lá fora”, o fechamento de sectores da sociedade com a obrigação de produzirem e divulgarem o conhecimento, a ausência de debate público, a personalização da crítica, uma certa superficialidade na abordagem de temas cruciais para a sociedade, o desprestígio crescente da área das ciências humanas, patente inclusive até nas apostas editorias, assim como a carência de um pensamento estruturado, coerente, sistemático nas mais diversas áreas do conhecimento em Portugal. Este estado de coisas está presente numa época em que quadros de compreensão não unilaterais do mundo e dos fenómenos humanos são cada vez mais necessários.
Compreendi como esse diagnóstico era certeiro e também como identificava um dos principais fatores dos graves problemas na nossa sociedade. Numa visão mais ampla, a nossa aridez intelectual acentua-se no meio do ruído que um mundo global e dominado pelas tecnologias de comunicação também provoca. A lógica quase exclusivamente comercial da publicação de livros e da divulgação de ideias, destinadas a um consumo voraz mas preguiçoso, tornou mais pobre o conhecimento das obras que contribuem para nos compreendermos melhor a nós e ao mundo que nos rodeia.
Ao conhecer o trabalho de OTA, descobri progressivamente e com espanto um autor português bem vivo como um trabalho ensaístico e filosófico de quatro décadas em contracorrente a esse dramático diagnóstico. O pensamento de OTA constitui um caso singular e original no panorama cultural Português. Trata-se de uma figura incontornável e improvável do século XX e XXI nacional no pensamento filosófico, na literatura e nos estudos culturais.
A sua obra é composta por centenas de livros, artigos científicos, intervenções académicas e públicas, nacionais e internacionais, e não está devidamente estudada nem suficientemente divulgada.
O presente livro visa o alargarmento da receção do seu pensamento ensaístico. A sua obra é um mundo. Autor prolífico, não será redutor dividi-lo entre o escritor, particularmente o cronista, e o filósofo e mesmo pensador das ciências sociais. Mas se o OTA cronista é mais e melhor conhecido, é principalmente sobre o pensador e o filósofo que este livro incide. É nossa tese que o pensamento do filósofo, não sendo tão conhecido entre nós, constitui a parte substancial e mais importante da sua obra.
A palavra de Onésimo T.Almeida:
Não me é fácil responder à sua pergunta “Como encara esta edição?”. Ver um volume sobre o meu pensamento antes do meu… passamento não é normal. Nunca esteve nos meus horizontes e parece estranho que esteja. Todavia, quem como eu toda a vida escreveu ensaios e viu-os quase sempre caídos no olvido, enquanto as estórias e as crónicas eram lidas e comentadas, não pode deixar de reconhecer que foi uma sorte apanhar para os ensaios um leitor do calibre do João Maurício Brás. Por sua completa iniciativa leu-os todos e achou que deveria fazer-se eco da minha vontade de diálogo com os patrícios interessados em questões para mim vitais e procurar atrair mais gente para essa conversação sobre uma problemática que é bem nossa e do nosso tempo. Em resumo: sinto-me com sorte.
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Nota: Agradecemos ao ilustre Diretor Jorge Massado do Jornal de Ciência,Tecnologia e Empreendedorismo – o "Ciência Hoje", por permitir a reprodução do texto acima pelo Blog Comunidades.