Os 269 anos da Chegada dos Ilhéus açorianos e o Dia de Reis.
Lélia Pereira Nunes
Faz parte do Ciclo Natalino a celebração dos Reis Magos. Por toda Santa Catarina, no dia 6 de janeiro, ouve-se cantar dos Ternos de Reis, desde Araranguá no extremo Sul até a histórica São Francisco do Sul ao Norte. O mesmo ocorrendo na Ilha de Santa Catarina, uma tradição que se mantém viva no coração do ilhéu, seja ele do Pântano do Sul, Ribeirão da Ilha ou da Lagoa da Conceição, Santo Antônio de Lisboa e Sambaqui. Até no distante oeste, em Chapecó, Concórdia, Caçador e na serrana São Joaquim observa-se a tradição de cantar aos Santos Reis. Poderia listar mais de uma centena de grupos que se espalham por todo o Estado, sobretudo, no litoral para o encantamento dos milhares de veranistas que lotam nossas praias e se deliciam com a simplicidade de sua cantoria. Alguns grupos são centenários e atravessam gerações – o Grupo da Estrela Guia da Família Martins, de Imbituba, a do Morro da Encantada de Garopaba e da Família Dias que veio de Tubarão para Blumenau. Munidos de sanfona, violão, rabeca, pandeiro e tambor os grupos saem às ruas e vão de casa em casa anunciando e louvando a chegada do Menino Jesus, a Estrela Guia que iluminou Belém e a visita dos Reis Magos. Uma tradição que a alma popular sulina reconhece como parte da memória coletiva e marco da sua história cultural.
Seis de Janeiro, dia dos Santos Reis é também dia de celebrar a chegada dos Ilhéus açorianos no Sul do Brasil, há exatos 269 anos. Abria-se um novo capítulo da nossa história escrita pelos bravos ilhéus açorianos – das ilhas Terceira, São Jorge, Pico, Faial, Graciosa e São Miguel. Os lhéus madeirenses, do Funchal, Câmara do Lobo, Ponta do Sol, São Vicente, Machico, começaram a chegara a partir de 1749.
Embora, em menor número, os “Casaes de madeirenses” que se fixaram em Santa Catarina, tendo aí descendentes, marcaram a sua presença e sua contribuição está patenteada na história cultural de Santa Catarina. “À guisa de exemplo, cito a família “São Thiago” cuja antepassada, Maria Eugênia Nóbrega de Oliveira, tem raízes na Madeira e por ancestral o povoador daquele arquipélago – João Gonçalves Zarco, bem como o poeta Marcelino Dutra, sua avó paterna era madeirense de São Vicente e sua familia chegou à Desterro em 1749 com Henrique Cesar Berenguer de Bettencourt e, ainda, do reverendo Padre Marcelino Marcelino de Sousa e Abreu aqui chegado em 1747 e um dos fundadores da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos em 1° de janeiro de 1765.
Até 1756 foram transportados cerca de 6.000 colonos açorianos e 1.367 madeirenses na maior mobilidade humana para o Brasil Meridional com o propósito de povoamento dentro do império português. Miseráveis, analfabetos, esquecidos e largados à sua própria sorte e, mesmo assim, com dignidade construíram o futuro e deixaram a sua herança e todo um imaginário enraizado que se reproduz e se expande pelo Sul do Brasil. Diz a quadrinha de uma cantoria do Ribeirão da Ilha: “ Nesta bela Ilha encantada/ Moram as fadas rendeiras/ Bisnetas das dos Açores/ E também das da Madeira.”
Afinal, o que conhecemos de fato sobre os Ilhéus madeirenses e o seu papel na nossa história? Não é chegadoa hora de dar maior visibilidade a sua presença e reverenciá-los antes que desapareçam nas brumas do tempo?
Na verdade, é preciso fazer e com urgência uma varredura completa por arquivos públicos e privados, alguns já cobertos por paranhos,folhas amareladas, cartas quase esquecidas que desvendem a verdade histórica firmada na memória coletiva. De se realizar uma profunda investigação sobre a presença “dos novos ilhéus” e sua real contribuição para o desenvolvimento cultural e econômico de Santa Catarina. Refiro-me aos Ilhéus que chegaram após grande epopéia do Século XVIII. São os emigrantes que partiram dos Açores e da Madeira, nos anos oitocentos, atraídos pela caça da baleia, pelo desejo de fazer fortuna “na terra dos esquecidos” ou os que emigraram até meados do seculo XX, com a esperança de encontrarem no Brasil a sua “Arvore das Patacas”.
Também estes correram atrás dos seus sonhos, da sua Estrela Guia.