Golfe Rústico
O golfe, nos Açores, tem um enorme passado pela frente, ou um enorme futuro por detrás…
Pergunto: para quê mais campos de golfe se estas ilhas são, elas próprias, campos de golfe naturais? Para quê a utilização de fertilizantes que só dão cabo dos nossos solos?
Em tempo de globalização, de massificação e de economia de escala, convirá não perder de vista este dado inapelável: os Açores possuem um dos mais ricos ecossistemas do mundo. E restarão ainda dúvidas de que o futuro destas ilhas passa, necessariamente, pela agricultura biológica e pelo ecoturismo?
Estou, pois, ao lado daqueles carolas que, tendo em conta o que se faz noutros países mais evoluídos do que o nosso, tiveram a assombrosa ideia de fomentar, nas nossas ilhas, uma forma original de praticar golfe sem afectar o ambiente: o golfe rústico, praticado em pastagens e zonas de vegetação rasteira.
Um desses entusiastas é o meu amigo terceirense Gilberto Vieira, presidente da Associação de Turismo em Espaço Rural (ATER), para quem o golfe rústico é "barato, ecológico e imaginativo" e não pretende substituir o golfe clássico praticado em campos próprios.
Somos portugueses e, já se sabe, a falta de meios estimula a criatividade e aguça o engenho. Quem fez a tropa aprendeu isto: toda a estratégia é boa desde que resulte.
Ora, o golfe rústico resulta. Depois de experiências bem sucedidas nas ilhas de São Miguel, São Jorge, Flores, Pico e Corvo, foi agora a vez da "ilha azul" conhecer esta nova modalidade desportiva.
Antes de mais, o golfe rústico promove um saudável exercício físico e proporciona uma actividade lúdica aos adeptos daquela modalidade num contexto rural.
Por outro lado, o golfe rústico fomenta o convívio, a boa disposição e os laços de amizade entre os seus praticantes, que vivem um contacto íntimo com a natureza. Digo, o encanto, a sedução, a harmonia e o fascínio destas ilhas que são belas e acolhedoras.
Isto também significa que o golfe rústico é uma forma de promover a Região Açores e poderá vir a ser um novo elemento de animação turística, que vem complementar e diversificar a oferta turística do arquipélago.
As regras aplicadas ao golfe rústico açoriano são muito semelhantes às do golfe tradicional, sendo que as grandes diferenças são o local da prova (pastos em vez dos habituais greens dos campos de golfe) e os buracos – nesta versão são substituídos por nove ou dezoito bandeiras e circunferências desenhadas na erva. No restante, pratica-se com o mesmo equipamento (um ou dois tacos), mas sem o rigor e o formalismo do golfe tradicional.
Bem vistas as coisas, isto de dar tacadas em terrenos ocupados por animais domésticos, culturas agrícolas e outras zonas rurais é um regresso às origens populares do golfe, o qual, antes de chegar às elites, era praticado por pastores escoceses que, para quebrar as longas horas de ócio vividas nos links (terrenos arenosos), faziam recurso dos seus cajados para bater bolas feitas com penas de ganso e envoltas em couro…
Ao que parece, o golfe rústico tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos nos Açores. Não é de admirar. Buracos não nos faltam…
Victor Rui Dores: “Golfe Rústico” (originally published in Diário Insular, 13 July 2014):
http://www.diarioinsular.com/version/1.1/r16/?cmd=noticia&id=61512
Nota:
Cronista Victor Rui Dores nasceu na ilha Graciosa, Açores. Licenciado em Germânicas pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, é professor da Escola Secundária Manuel de Arriaga e, na cidade da Horta, desenvolve apreciável atividade cultural. Com vários livros publicados, é poeta, romancista, contista, ensaísta, cronista, crítico literário, e, nos últimos anos, tem-se dedicado à etnomusicologia e à linguística. Colabora regularmente nos jornais, na rádio, na televisão dos Açores e da diáspora e está ligado à atividade teatral como ator e encenador. É, desde 1998, o representante da Região Autónoma dos Açores no Conselho Nacional de Educação.