AO EXPIRAR DO ANO DE 1895
Mais um ano caído no passado!
Nesse profundo, insondável, mar
Que nunca restitui o que há tragado,
Que só recebe, mas sem nunca dar.
Mais um ano!…baixel misterioso,
Ele leva em seu bojo confundidos,
O oiro, o ferro, o vil, o precioso,
O gozo de uns e de outros os gemidos.
Mais um ano!… acaso imaginais,
Quantas esperanças, quantas alegrias,
Quantas dores houve e quantos ais
Em trezentos sessenta e cinco dias?
Que pena poderia descrever,
E num vasto poema condensar,
Todos os dramas de íntimo sofrer
Que um ano tornam num revolto mar?
Mais facilmente os gozos fugitivos
Poderiam contar com número certo,
Raros oásis, sempre, sempre esquivos,
Nesse inclemente e árido deserto.
Felizes os que viram com saudade
Sumir-se no passado o velho ano,
E, bafejados da felicidade,
Não passaram por triste desengano.
…………………………………….
Que a vida vos corra calma e pura,
Em branda paz, suave e permanente;
Que o novo ano só vos dê ventura,
É essa a nossa aspiração ardente.
João Caetano,
in Padre Manuel de Azevedo da Cunha, Notas Históricas, Vol I,
Ponta Delgada, 1981.
Lacerda, João Caetano de Sousa e Lacerda ( 1829-1913), natural da fajã da Fragueira, freguesia de Ribeira Seca, ilha de S. Jorge, foi, administrador do concelho da vila da Calheta da mesma ilha e veio a falecer na fajã natal.