A BOMBA DE HIROSHIMA
As bombas lançadas sobre Hiroshima, a 6 de Agosto de 1945 e três dias depois, sobre Nagasáki, revelar-se-iam o primeiro acto da Guerra Fria, com vista a alterar os acordos de Yalta sobre a questão do Extremo Oriente, favorecendo a rendição japonesa aos EUA, conforme afirmou P. M. S. Blackett ( Les Conséquences Militaires et Politiques de l’Energie Atomique, New York, 1948.)
David Mourão-Ferreira, no romance UM AMOR FELIZ, referirá esta trágica ocorrência. O narrador Fernão, enquanto vai de carro de Lisboa para casa, a caminho do Monte Estoril, em flash-back, sobre o tempo da adolescência e das férias na Foz do Arelho, reconstrói o Verão de 1945 e a notícia do lançamento da bomba atómica:
“Através deste nevoeiro vejo contudo distintamente a menos enevoada de todas as manhãs em que o mar e a lagoa da Foz do Arelho cintilaram naquele Verão. Espalhara-se a notícia de que tinha sido lançada em território japonês uma bomba atómica; e que desta vez é que de vez a guerra terminaria. Quase ninguém a começar ou a acabar em mim sabia exactamente o que fosse tal bomba. Pela minha parte imaginava-a como um feixe apertado de pequenos foguetes, todos de cabeça para baixo, e cujas cabeças contivessem um átomo de não sei quê.” ( Um Amor Feliz, p. 134)”Através deste nevoeiro vejo contudo distintamente a menos enevoada de todas as manhãs em que o mar e a lagoa da Foz do Arelho cintilaram naquele Verão. Espalhara-se a notícia de que tinha sido lançada em território japonês uma bomba atómica; e que desta vez é que de vez a guerra terminaria. Quase ninguém a começar ou a acabar em mim sabia exactamente o que fosse tal bomba. Pela minha parte imaginava-a como um feixe apertado de pequenos foguetes, todos de cabeça para baixo, e cujas cabeças contivessem um átomo de não sei quê.” ( Um Amor Feliz, p. 134)
De outra ficção,esta cinematogáfica, mas apoiada em documentos autênticos, se apresenta o cenário, por contraste com a imaginação de Fernão. A guerra, apenas imaginada, não causava danos na Foz do Arelho. A verdadeira, sim. Aqui vemos uma corajosa professora a salvar as crianças, não se salvando a si mesma. Vale a pena ler:
” Dès la chute de la bombe ton école avait pris feu et s’était presque aussitôt écroulée, brûlant vives presque toutes tes camarades. Tu avais été blessée, tu étais évanouie, et tu serais morte sans ton institutrice qui te pris dans ses bras et te sauva…
Pendant ce temps, ta mère avait repris connaissance. Elle réussit à sortir des ruines. Elle tenait dans ses bras le corps encore tiède de ton petit frère Akio. Il n’était plus, hélas, qu’un cadavre. Elle partit dans la ville en flammes.
Tu étais alors, toi et tes derniers camarades, en train d’entrer dans le fleuve. La chaleur de l’incendie était si terrible que vous aviez dû pénétrer dans l’eau pour sauver la vie. Il ne fallait pas penser à traverser le fleuve. L’autre rive était aussi un affreux brasier. En sauvant ses écolières, en te sauvant toi-même, ton institutrice s’est avancée trop avant. On l’a vue lutter contre le courant, puis y disparaître… “
( Extraits du scénario du film «Hiroshima», par Yastaro Yagi d’un recueil de documents authentiques, par le professeur Arata Osada, et publiés par lui sous le titre ” Les Enfants de la Bombe Atomique” )
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Teresa Martins Marques (n.1950) é investigadora integrada no Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Doutoramento em Estudos de Literatura e de Cultura, na especialidade de Estudos Portugueses, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2011) com a tese: «Clave de Sol – Chave de Sombra : Memória e Inquietude em David Mourão-Ferreira». Foi responsável pela organização do espólio de David Mourão-Ferreira na Fundação Calouste Gulbenkian, entre 1997 e 1999. Dirigiu a edição das Obras Completas de José Rodrigues Miguéis entre 1994-1996, assinando os respectivos prefácios. Autora de inúmeros verbetes em dicionários e enciclopédias. Presença destacada em eventos científicos e literários em Portugal e no estrangeiro e tem abundante colaboração em jornais e revistas especializadas no País e estrangeiras. É membro efectivo do Pen Club Português; da Associação Portuguesa de Críticos Literários (membro do conselho fiscal) ; integra a direcção da Associação Portuguesa de Escritores, desde 2008.
Uma das mais importantes vozes da literatura contemporânea e respeitada crítica literária.
Importante e profícua produção literária. O seu mais recente romance A Mulher que Venceu Don Juan foi muito bem recebido pelo público leitor e pela crítica. Muito brevemente , A Mulher que venceu Don Juan será apresentado com destaque no Brasil, nas cidades de Rio de Janeiro e em Assis (São Paulo) em eventos literários da maior relevância.