(…)Sobre o poema eu gostava de te explicar algum coisa do assunto, pois muita coisa importante poderá escapar a quem o ler desprevenidamente.
Escolheram-no para aquele jardim, porque é dedicado à Rainha Santa
Isabel, padroeira de Coimbra, que foi princesa de Aragão e depois
Rainha de Portugal pelo casamento com o Rei D. Dinis, o nosso
Rei-Trovador, do século XIII, um dos melhores líricos que figuram nos
códices da poesia trovadoresca galaico-portuguesa.. Sei de cor
algumas das suas “cantigas de amigo” e “de amor”. São lindas!
Mas comecemos pelo título do meu poema: “Oração em Santa Clara a
Nova”. Santa Clara é uma freguesia de Coimbra que fica na outra margem
do Mondego. Lá se encontra um mosteiro que foi de freiras claristas,
ali edificado no século XVII para recolher as monjas do primitivo
Convento de Santa Clara, do séc. XIII, que teve de ser abandonado
pelas suas ocupantes quando começou a ficar submerso em parte em
consequência da subida do nível da água do Mondego. Ao primitivo
convento se recolheu depois de ficar viúva a Rainha Santa Isabel, que,
aliás, sempre o tivera sob a sua protecção. Não professou, mas vestiu
o hábito e por ali ficou, em paço próprio. e ali foi sepultada. Quando
as freiras foram transferidas para o novo Convento, os seus restos
mortais foram-no também, e ali estão ainda, num túmulo de prata batida
do ourives portuense do século XVIII Manuel Carneiro da Silva. Tendo
passado a haver dois mosteiros da mesma devoção a Santa Clara, entrou
o costume de se chamar ao do séc. XVII “de Santa Clara a Nova” para,
nomeando-o, não se fazer confusão com o primitivo, que se passou a
designar de “de Santa Clara a Velha”.
Uma lenda, que se tornou emblemática da memória e iconografia da
Rainha Santa Isabel, é a do Milagre das Rosas, que certamente
conheces. É uma lenda lindíssima, importada da Humgria, onde o mesmo
milagre é atribuído a uma Rainha também chamada Isabel. Entrou na
nossa tradição em tempo que se desconhece,e quadra muito bem à
personalidade da bondosíssima rainha, tanto que até era tolerante para
os “desvairos” amorosos do real esposo, ao ponto de criar no paço os
bastardos que ele lhe trazia daquelas “amigas” com quem tropeçava sob
as “flores do verde piño” e as emoldurava depois, “velidas” e
“louçanas”, nos seus “cantares de amigo”.
O milagre das rosas deu-se uma vez em que a Rainha de dirigia, às
escondidas do Rei, como costumava, ao encontro dos seus pobres,
levando-lhes uma abada de pão oculto no regaço. Fazia-o às escondids
do Rei, porque este a tinha proibido de andar a delapidar o erário
régio com a sua excessiva caridade. Pois desta vez, o Rei saiu-lhe ao
caminho e, desconfiado do destino da Rainha naquela sortida do paço
não agendada, perguntou-lhe que era aquilo que ela levava no regaço
tão escondido. A Rainha, atrapalhadíssima, não tinha saída para aquela
situação e, apesar de Santa, mentiu -lhe, respondendo, trémula, ante
a ira do marido: “São rosas, meu Senhor”.
Furioso, D. Dinis ordenou-lhe que descobrisse o regaço para ele ver
aquelas rosas. A Rainha não tinha mais como guardar o seu segredo e
descobriu o regaço, de onde rolaram para o chão as mais lindas rosas
que jamais tinham visto na vida o Rei e os pobres que ali estavam à
espera de pão. Os pobres ajoelharam, espantados com o sucedido, e o
Rai, envergonhado, tomou a mão da Santa Rainha, subiu-a para a garupa
do cavalo, e lá foram os dois, ela abracando-o amorosamente pelas
costas ainda mal refeita do susto, a caminho do palácio.
Bem, o milagre da Rainha Santa foi este, da transformação do pão em
rosas. A Isabel do meu pobre poema é esta, qee está na Igreja de
Santa Clara a Nova, a quem um dia eu levei um braçado de rosas
brancas, que depus junto do seu túmulo.
Lido depois desta explicação, o meu pobre poema talvez fique um pouco
menos pobre.
Eduíno de Jesus,por e-mail em 24/9/2010
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Imagens: créditos Lélia Nunes
Legenda imagem da Rainha Santa Isabel, séc-XVI, Convento São Francisco, Alenquer PT.