Palavras sólidas em clima eleitoral
Ubiratan Brasil
Em ano eleitoral, como o discurso político se torna volátil, é prudente apoiar-se em palavras sólidas, como as escritas por Luis Fernando Verissimo, João Ubaldo Ribeiro e Ignácio de Loyola Brandão. Dos dois primeiros, acaba de chegar às livrarias a reedição de obras em que a política é tanto tratada como sátira (Verissimo) como com seriedade professoral (Ubaldo) – são As Cobras e Política – Quem Manda, Por Que Manda, Como Manda, editados pela Editora Objetiva. Desde a semana passada, também está disponível Zero em edição comemorativa de 35 anos de um clássico de Loyola que foi censurado pelo regime militar nos anos 1970.
As Cobras é uma antologia com tiras criadas por Verissimo a partir de 1975. Com um traço tosco, minimalista, as simpáticas répteis ridicularizavam a situação sociopolítica nacional em um momento sufocante, com os militares ditando normas no poder. O escritor dizia ter escolhido cobras por se tratar de um bicho fácil de desenhar, mas, na aparente ingenuidade, elas desafiavam Deus, técnicos de futebol e, principalmente, políticos.
– O desenho tem uma conotação lúdica, infantil, que lhe permite ser mais “malcriado” do que o texto – diz Verissimo, em entrevista, em que não revela intenção de ressuscitar as cobrinhas, “mortas” em 1999 depois de longo sucesso em jornal e em livro (uma primeira coletânea foi editada nos anos 1980).
Política é uma nova edição da obra que João Ubaldo lançou em 1981, na qual exercita os conhecimentos de mestre em Ciência Política e Administração Pública, curso frequentado na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos.
No livro, Ubaldo parte do princípio de que qualquer homem civilizado não escapa da política, mesmo aquele que foge de mensagens divulgadas pela imprensa. “Isso nos torna indiferentes e, em última análise, ajuda a que o político que está na televisão consiga o que quer, já que não nos opomos a ele”, escreve. Sem citar o nome de nenhum político ou mesmo de partido, Ubaldo apresenta um prazeroso manual de entendimento, útil em épocas eleitorais.
Zero, por outro lado, recupera um momento obscuro da história brasileira. Trata-se de um fantástico jogo intelectual, com a ficção se confundindo com a realidade em meio a colagens de desenhos unidos às vezes por frases sem pontuação. Loyola usou o material censurado que recolheu durante vários anos do jornal Última Hora, no qual trabalhava como secretário gráfico.
“Eis aí o outro Brasil, que ninguém conheceu, ninguém soube”, disse-lhe um amigo. Era o empurrão necessário. Publicado primeiro na Itália, em 1974, Zero chegou ao Brasil em 1975. Sucesso imediato de público e crítica, despertou a atenção dos militares. Proibido, só foi liberado em 1979.
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(*) UBIRATAN BRASIL Jornalista, formado pela USP, Editor Assistente do Caderno 2 e Crítico Literário do jornal O Estado de S.Paulo