Cronista da alma da Ilha, de Florianópolis, do carnaval, da terra, do mar, dos valores mais típicos da nossa gente. Este era seu chão e daí gerava a sua escrita simples e alegre, daí criava seus programas na TV -"Bar Fala Mané" na SBT-SC, onde de tudo acontecia e cada gravação era uma grande festa. Em torno do Bar rolavam entrevistas, muita música, causos e a boa cozinha típica da Ilha. Aldírio tinha voz e vez. Dava voz e vez para a sua gente narrar histórias e causos,convidar para festa do Divino, lavrar o seu protesto ou simplesmente deixar o samba rolar. Pois, Carnaval era com ele mesmo. Por quase 20 anos respondeu pela coordenação do Carnaval de Florianópolis.
Aldírio armava seu palco, tendo por o cenário uma réplica do Mercado Público, em qualquer lugar que fosse preciso. Seja lá na Praia do Saquinho,na Festa da Cruz, no extremos Sul da Ilha, seja no centro histórico da capital ou no tradicional Lira Tênis Clube ou ainda no Estreito, em Itaguaçu, em Coqueiros, no outro lado da Ponte. E a tudo registrava com aquele bom humor, picardia, prosa divertida, sedutora tão típica do nosso Ilhéu. Se fazia ouvir nas emissoras de radio, na televisão e nos jornais onde mantinha a sua coluna diária Fala Mané no NA Capital,suplemento do Jornal A Notícia, de Joinvile. Iniciou a atividade de jornalista em 1972, começando no jornal "O Estado"com a coluna Fala Mané. Trabalhou em todos os jornais, emissoras de televisão e nas rádios A Verdade, Cultura e Diário da Manhã. Foi funcionário da Prefeitura de Florianópolis desde 1976, superintendente da Fundação Franklin Cascaes (1988) e diretor de Artes da Fundação Catarinense de Cultura (1994).
Cronista irreverente, apaixonado pela Ilha e por Florianópolis. Biografou centenas de personagens,perfis desenhados com ternura e alma, que só encontravam aqui nesta "terra dos casos e ocasos raros" como dizia Seixas Neto. Suas crônicas e narrativas, quase uma oralidade, são deliciosas,pícaras e se questionado quanto a veracidade do fato contado,jurava de pé junto, os dedos em cruz sobre a boca que não só acontecera como testemunhara "por esta luz que me alumia".
Sua obra, boa parte publicada, fala do cotidiano ilhéu, do espírito da Ilha, da nossa memória coletiva, naquela linguagem marcada pelo tempo, verdadeiro patrimônio cultural, não tem? Pois, agora…
Fiel à Ilha, fiel aos costumes e tradições, a essência do ser, estar e do viver ilhéu. Ele que nasceu na linda praia de Canasvieiras,no norte da Ilha, junto ao rio do Brás que o escriba rememorava com saudade de suas águas cristalinas. "Ao trabalhar com costumes,fatos e personagens de verdade,o que ele escreve é um excelente acessório para o estudo da vida da cidade no passado recente e no presente",escreve o escritor Flavio José Cardozo no prefácio de seu livro "Fala Mané" (1998),editado pela Fundação Franklin Cascaes. Em 2003 recebe a Medalha de Mérito da Câmara Municipal de Florianópolis.
Publicou: "Domingueiras Sou Ilhéu Graças a Deus"1990(crônicas); Retratos à Luz de Pomboca",1997(perfis); "Fala Mané",1998 (crônicas);participou da coletânea "Contos de Carnaval" e do projeto "História do Carnaval de Florianópolis" – da agência Propague, com edição de um disco com músicas de Carnaval; "O Pirão Nosso de Cada Dia",1999 (gastronomia).
Por sua postura corajosa e defensiva da cultura ilhoa e do ilhéu Mané é referenciado como o "Manezinho-mor". No tempo em que ser Mané era considerado um termo pejorativo e identificava o nativo, do interior da Ilha, usado com desdém tanto pelos urbanos como "os de fora" por causa do sotaque chiado e do falar ligeiro,cantado, engolindo sílabas ou puxando nos "esses, xis e zes",o dialeto manezês, criou o Troféu "Manezinho da Ilha" homenageando personalidades aqui nascidas e inventou a figura do "Manezinho Honorário" para àqueles que não tiveram a glória de terem nascidos ilhéus mas fizeram da Ilha seu chão de amor e deixaram aqui sua alma cativa para sempre.
No ano de 1998, numa ação de intercâmbio cultural – "De volta às Raízes," promovida pela Direção Regional das Comunidades, do Governo Regional dos Açores, Aldírio Simões visitou as Ilhas Terceira, Faial, Pico e São Jorge. Apaixonou-se perdidamente pelas ilhas. Seu livro "O Pirão Nosso de Cada Dia" (1999) não se limita apenas a um compilado de receitas que vêm sendo passadas de pai para filho desde a chegada dos açorianos, em meados do séculoXVIII. Mas, também contém receitas que ele trouxe acompanhado de relatos e experiências vividas no arquipélago.
Desde então muitos açorianos sentaram no Bar Fala Mané e deixaram seus depoimentos como Onésimo T.Almeida, Victor Rui Dores, Carlos Alberto Monis, Alzira Serpa Silva ou se apresentaram como Grupos Folclóricos, Corais e Bandas Filarmônicas.
Seu grande sonho era gravar um programa do Bar Fala Mané nos Açores. O projeto começou a ser construído em parceria com a SBT-SC e Fundação Franklin Cascaes. Faltava buscar o parceiro açoriano. Esta foi a minha tarefa acertada na escadaria da Igreja do Rosário, no Frattelanza, em 30 de dezembro de 2003. Se desse certo, os contatos mantidos com os Açores, a noticia seria divulgado no programa de abertura do ano, dia 23 de janeiro de 2004, a ser realizado naquele mesmo local, dentro do projeto Piano na Escadaria. Em janeiro de 2004, quando fui participar das Jornadas da Emigração, realizadas em Ponta Delgada, levei em mãos a proposta do Aldírio e apresentei a Osvaldo Cabral, na época Diretor Geral da RTP-Açores, que acolheu com entusiasmo o projeto previsto para junho de 2004. A missão foi comprida, a boa notícia festejada com seus amigos e divulgada na Imprensa, na sua coluna Fala Mané. Faltava divulgar oficialmente no Programa Bar Fala Mané, a ser gravado na noite de sexta-feira, dia 23 de janeiro de 2004.
No entanto, o Bar não abriu. Um dia antes, na manhã cinzenta de quinta-feira, Aldírio Simões pregou-nos uma grande peça – simplesmente desgarrou sua Ilha e partiu… E nem se despediu com o costumeiro "beijo no fundo do coração".
"Aldírio Simões, tão tragicamente desaparecido – e dessa forma tão díspar de seu perpétuo bom humor – foi, sem dúvida, esse Mané manufaturado com o mais legítimo barro da Ilha, e a cujo corpo o Senhor deu vida com um sopro de vento Sul.", escreveu Sergio da Costa Ramos na crônica O Homem que Inventou o Mané, em sua coluna no Diário Catarinense de 24/01/2004.
Agora, passados cinco anos… Fala Mané!
Florianópolis,Ilha de Santa Catarina, 23 de janeiro de 2009.
Nota: Imagem copy right: http://www.guiafloripa.com.br/ricardinhomachado