Caminhos do Divino, caminhos de Portugal
O ponto alto das Festas do Espírito Santo, com a realização dos bodos e a coroação de crianças, ocorre já no próximo dia 27 de Maio (Domingo de Pentecostes). O autor destas linhas, natural dos Açores, não é indiferente às celebrações em honra da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade. Para além dos Açores, a devoção ao Divino Espírito Santo está hoje bem presente no Brasil, nos EUA e no Canadá, mas acompanha, em regra, os açorianos em todos os lugares aonde a emigração os levou. Atribui-se à Rainha Santa Isabel a introdução do culto em Portugal, mas as festas, no Continente, estão hoje limitadas a Tomar (Festa dos Tabuleiros), Alenquer e poucas outras localidades. O culto do Espírito Santo possui características assaz interessantes. A sua organização e rituais parecem apontar para as doutrinas de Joaquim de Fiore, abade cisterciense de finais do séc. XII, sendo de notar a relativa autonomia face à Igreja, já que se dispensa, em muitos aspectos, a intermediação do clero. Feita esta introdução, passo a referir as outras razões que motivaram este texto. Tive o prazer de conhecer a professora universitária Lélia Pereira da Silva Nunes (descendente de açorianos) em 2007, durante uma sessão cultural em Lisboa. Serviu a sessão para a apresentação do seu livro “Caminhos do Divino, Um olhar sobre a Festa do Espírito Santo em Santa Catarina”, que é o resultado de uma pesquisa exaustiva levada a cabo pela autora, durante 19 anos, em Santa Catarina, Brasil. Lélia Nunes tem um imenso amor a Portugal e aos Açores, em particular. Na referida sessão, falou-se do que agora vou recordar: há mais de 260 anos, do porto de Angra, partiu a primeira leva de açorianos, naquela que viria a ser a mais importante página do povoamento do Sul do Brasil em todo o século XVIII. Entre 1748 e 1753, de acordo com os planos da coroa portuguesa e a acção determinante do engenheiro militar Brigadeiro José da Silva Paes, emigraram para as “terras dos esquecidos”, 7817 açorianos. Famílias completas. Passados todos estes anos, continuam bem vivas, na Região Sul do Brasil, as tradições portuguesas, de que se destacam as Festas do Espírito Santo. Nestes tempos conturbados que Portugal atravessa, é bom recordar que se tem amigos naquela margem do Atlântico Sul. Enquanto houver pessoas como Lélia Nunes, o “espírito português” não se apagará decerto naquelas paragens. Do lado de cá, pela vontade dos portugueses e com uma pequena ajuda do Divino, Portugal não se diluirá. Tenho fé !
Nota:Artigo publicado no Jornal português “O Diabo” em maio de 2012,na coluna de opinião TOCAR A REBATE.
O autor, Cel.Engº Eduardo Brito Coelho, é açoreano, natural de São Miguel (P. Delgada) e vive em Lisboa.