Comentário à Carta Aberta ao Fernando Aires de Onésimo Almeida
Caríssimo Onésimo,
Está uma crónica sentida, afectiva e realisticamente autêntica. Entre os que não o conheceram bem, talvez haja quem possa estranhar o que escrevemos acerca do Fernando Aires. Porque ele era elitista em quase tudo o que fazia. Mas era por isso mesmo que mais gostávamos dele. O que falta a este país é uma verdadeira elite, ou escol, para falar mais portuguesmente. Sem um escol de cientistas, de artistas, de políticos e de tudo o mais, nenhum país resiste. Nenhum país, nenhum povo. O Fernando Aires era exigente como professor, e era bem capaz de dar uma má nota doendo-lhe a alma. O FA era exigente na qualidade do Português que deveria ser usado em livros, em jornais, em simples diálogos de circunstância. O FA era exigente quanto à música que ouvia. O FA era exigente a respeito das amizades, e por isso era uma honra enorme merecer pertencer ao seu grupo de amigos. Este Portugal há muito que não era coisa que lhe agradasse. Onde a disciplina e o rigor do saber do velho Liceu? Onde a competência e o bom gosto cultural que até num jornaleco como “A Ilha” ganhou um brilho irrepetível ou pelo menos não repetido? Um povo que descuida a sua Língua e a sua História (dois dos maiores amores do FA) destrói a Língua e a História. Fica sem referências. O nosso nem geográficas tem sequer. Um povo capaz de pôr a revolução de 1640 em 5 de Outubro ou de fazer o Tejo passar por Mértola é um povo vencido. O nosso está há muito derrotado. Têm-se seguido aflitivamente os reis fracos. Estamos no caos, meu Caro. Por isso eram precisos muitos Fernandos Aires. Um abraço, Daniel
Maia,14 de novembro de 2010