De repente, parece que a atmosfera impregnou-se apenas de más notícias. A beleza natural da Ilha Catarina não se degradou; ao contrário, reluz entre raios, trovões e – por que não? – até um pouquinho de sol…
Apesar desse brilho – e do que parece ser apenas oco saudosismo – já vivemos tempos melhores.
A atmosfera de outras épocas guardava um certo e inconfundível glamour, um ar de inocência perdida. Os raios fúlgidos daquele mesmo sol, que transpassava o alto das bandeirolas coloniais – em cujo facho levitavam miríades de flocos da poeira “cósmica” – hoje apenas coam notícias azedas, a eterna e abominável crise política, o país afogado na corrupção e no descrédito.
Das ruas de hoje já não ecoam os velhos pregões matinais do amolador de facas e tesouras, do padeiro, do peixeiro, do verdureiro – pau-de-canga atravessado nos ombros, a transportar os verdes e as raízes, os aipins e os “inhames”. Sem falar de frutas hoje quase raras, como a fruta do conde e as romãs.
A Deodoro, segunda transversal da Felipe, chamava-se Rua do Ouvidor, como a que existia na Capital Federal. Mas essa era uma rara “imitação” da metrópole. No mais, a rua, apesar de central, mantinha o seu caráter de sítio urbano com feição de rural. As casas ainda eram geminadas e não dispensavam os quintais, “reservas” povoadas de ovinos, caprinos e crianças.
À noite, flanavam por suas calçadas as bruxas desgarradas e a cachorrada uivante, acompanhados pelo coaxar dos sapos. As famílias moravam em ruas de nomes mais amáveis e naturais, como “Rua da Pedreira” ou “Rua dos Artífices”. Os bairros se chamavam “Praia de Fora” , “Bairro da Toca” (Prainha) ou “Largo da Princesa” (Benjamin Constant).
***
Vivemos a pós-história caotizada daquela cidade-presépio, que floresceu em torno da Matriz e da Praça XV – o Mercado Público como “empório” de víveres e de viventes.
Nem tudo que é “velho” era bom. Num tudo da nova cidade é ruim. Mas toda cidade com superpopulação perde a qualidade de vida e a paz de espírito. O formato municipal de países como a Inglaterra considera “ingovernáveis” as urbes com mais de 500 mil habitantes, com inevitável perda de IDH, o índice medidor da ONU para o desenvolvimento humano das cidades.
Floripa está, perigosamente, nesta fronteira do purgatório: entre o céu e o inferno.
________________________________________
Sergio da Co9sta Ramos.
Jornalista,escritor. Membro da Academia Catarinense de Letras.
Cronista dos mais festejados de Santa Catarina.