Há atitudes que nos chegam como o Verão: quentes, doces, aromáticas e envolventes.
Há atitudes que nos trazem a infância embrulhada em seda e a maturidade dourada dos poentes sobre o azul sereno do mar.
Há atitudes que falam a linguagem do amor: simples e linear para uns, complexa e polissémica para outros; mas sempre inigualável espelho de uma imagem única e irrepetível.
Há atitudes que se inscrevem na vida como um rio – jamais encontraremos a mesma água que nos banhou o cansaço e se ofereceu à nossa sede.
Há atitudes que se elevam como sóis reluzentes a afagar a nossa solidão quebrada.
Há atitudes que desenham os voos nobres das gaivotas quando conduzem as irmãs nos céus das lembranças, antes de estas se apagarem no vazio do esquecimento.
Há atitudes que geram movimento espiral e unem pessoas num fulgor de despedida ardente e curador.
Há atitudes que têm a cara das pessoas: bonitas, sorridentes, luminosas.
As caras bonitas, sorridentes e luminosas são as da Irene Blayer e da Lélia Pereira Nunes; a iniciativa foi a de me abrir um espaço de testemunhos de amigas e amigos, que pousaram no blogue das Comunidades as suas vozes com a graça da ternura e a generosidade da sua grandeza.
Desejava, há muito, ter registado a confissão das emoções que o espaço das amigas Irene e Lélia acendeu. Mas não era chegado o tempo.
Eu tinha que percorrer uma estrada de silêncio para me escutar; tinha que escutar o mar para me sentir; tinha que me sentir para ser.
De tudo, resta quase nada: uma memória breve de voo alado em plenitude sobre o mundo; a (in)certeza de uma identidade tendente a esboroar-se nos escombros do presente; a palavra nómada exposta às equivocidades das distâncias; a dispersão solitária de um rumo tecido de inquietações.
De tudo, resta quase nada: um pequeno canteiro de flores que sobreviveu a muitas tempestades.
Houve o antes, há o agora – não conflituam, mas são estranhos que precisam harmonizar-se e sou eu quem pode construir com eles uma linha contínua, sem rupturas.
Agora a vida cai do calendário com espanto. Antes, eu nem a via. Os dias corriam uns atrás dos outros sem que eu lhes notasse a forma nem lhes sentisse o cheiro; apenas me erguia e me deitava por imperativo do corpo e no momento de me deitar – aí, sim! – permitia-me a clareira da música para me adoçar a alma (tantas vezes submersa e sem voz por exílio voluntário!). Agora encontro a vida ao acordar e quedo-me no pasmo e na dúvida do que fazer com ela.
Reaprender tudo deveria ser um objectivo nítido, mas sou tentada a pousar, de mansinho, neste ramo firme que me (a)guardou durante mais de doze anos, e aqui me aquietar. Aninhada no sorriso iluminado do David, no humor irreverentemente delicioso do Hugo, no brilho imenso dos olhos do João, na sensibilidade especial da Carla, na âncora do amor do Mário, na partilha sublime com as irmãs e irmãos do meu afecto, no alicerce imperecível das amigas e dos amigos.
É, pois, este o tempo de rever a partida que já não dói e chamar ao abraço os amigos que ali se perfilaram para me acolher no embalo carinhoso da sua companhia. Visito-os um por um, banhada pela claridade da gratidão.
Bem hajam!