Descobrimento Científico dos Açores
SANTOS NARCISO
Veio pela mão do meu Amigo, Vicente Borges de Sousa e logo se tornou minha companhia de leitura. Falo do livro “Descobrimento Científico dos Açores”, do Professor e Investigador Luís M. Arruda, um faialense de gema, com vida e estudos de projecção regional e nacional. Antes de falar do livro, porém, quero referir uma história curiosa que nunca esqueço. Durante a minha vida de jornalista, e desde há muito, era eu, anualmente, a representar o jornal “Correio dos Açores” na sessão de apresentação de contas de uma empresa de referência na Região, a SAAGA, a que se seguia sempre um agradável convívio. A empresa tinha sempre um gesto peculiar para todos os convidados, com uma oferta no fim do convívio. E a oferta sempre foi: um livro. Em regra, um número da revista “Atlântida”. Recordo-me perfeitamente de, já depois da doença que me impossibilitou de continuar a estar presente, o meu Amigo Aníbal Raposo, administrador da empresa, ter a lembrança de me mandar entregar o livro. Gestos que não esqueço. Desta feita, Vicente Borges de Sousa também fez questão de me dizer que este “Descobrimento Científico dos Açores” foi o livro oferecido, este ano, no almoço da SAAGA. E, realmente, não poderia haver oferta mais adequada e interessante.
Trata-se, de facto, de um livro extraordinário que merece ser conhecido e divulgado. Editado pelo Instituto Açoriano de Cultura e contando com apoios da União Europeia, Governo Regional dos Açores e Prorural, desenvolve-se em mais de quatrocentas páginas, que vão desde o povoamento até ao início da erupção dos Capelinhos. A obra foi apresentada no passado mês de Fevereiro, na Horta, em Angra e Ponta Delgada, e a ela se referem diversas notícias na imprensa regional e nacional.
Mas, em jeito de opinião pessoal, de leitor atento e agradecido pelos muitos ensinamentos colhidos, não podia deixar de fazer aqui esta referência, neste espaço de “Leituras do Atlântico”, até porque todo este “Descobrimento Científico dos Açores” tem um fundo imensamente Atlântico que nos transporta a uma visão diferente destes séculos de vida nas ilhas, desmistificando e fundamentando, sempre dentro de um enorme respeito por outras narrativas já existentes.
O livro é constituído por quatro grandes capítulos, todos eles com a mesma estrutura de apresentação e enriquecidos com “outras contribuições” e com uma vasta e rica bibliografia, só por si capaz de prender e levar a outros patamares de conhecimento quem por estes assuntos se interesse. No primeiro capítulo, Luís M. Arruda disserta sobre os Açores, desde o povoamento até finais do século XVIII, sendo o segundo capítulo dedicado à primeira metade do século XIX, com destaque para as contribuições de viajantes, exploradores e naturalistas, em que se inclui a escala de Darwin pela Terceira e a célebre passagem do autor de “A origem das espécies” aos Açores a 1859.
E é a partir desta data (1859) até à I Grande Guerra que Luís Arruda desenvolve o terceiro capítulo do livro, com desenvolvimento de temas altamente interessantes, como sejam as descobertas oceanográficas, o Serviço Meteorológico dos Açores, a passagem do “Challenger” e do “Talisman” e a primeira escala de Alberto de Mónaco.
No último capítulo, que abrange a mais recente época, que se estende da I Guerra Mundial à erupção do Vulcão dos Capelinhos, temos um rico manancial de elementos e narrativas que nos prendem e cativam.
Seja-me permitido dizer aqui que este livro, na sua linguagem e no seu acervo de conhecimentos, fez-me recuar aos anos sessenta do século passado, estava eu a estudar no Seminário de Angra e, de vez em quando, tínhamos umas “aulas-conferência” com o Tenente-Coronel José Agostinho que eram simplesmente apaixonantes, embora não tivéssemos capacidade para apreender tudo o que ele nos dizia.
O professor Luís M. Arruda não necessita aqui de nenhuma apresentação. Deixo apenas aquilo que vem no próprio livro e que consta da nota de apresentação do IAC: Nasceu na Horta, em 1944. Doutor em Ciências pela Universidade de Lisboa foi professor nesta Universidade, investigador no IMAR – Instituto do Mar, investigador convidado na Universidade Católica, coordenador geral da Enciclopédia Açoriana e editor do Boletim do Núcleo Cultural da Horta. Inicialmente, desenvolveu a sua atividade científica na área da biologia aplicada às pescas e, posteriormente, dedicou-se ao estudo e à divulgação do descobrimento científico dos Açores. É autor de dezenas de artigos científicos incluídos em livros e revistas nacionais e estrangeiros especializados e de mais de uma centena de artigos de divulgação científica e de opinião na imprensa regional açoriana. Foi comissário científico da exposição “A República e a ciência” e integrou o Conselho Científico do Portal das Comunidades Açorianas e a Comissão Municipal de Toponímia da Horta. A Câmara Municipal da Horta atribuiu-lhe a medalha de mérito municipal dourada pelo seu contributo para a divulgação da cultura açoriana, nomeadamente a faialense.
A história dos Açores é simplesmente apaixonante. Este livro de Luís M Arruda enriquece e ajuda-me na compreensão de outras obras que tenho lido, em outras vertentes, todas elas de grande alcance e valor. Falo da “História dos Açores” de Carlos Melo Bento, que como o próprio referiu na altura, “não pretende agradar a ninguém, nem fazer obra acabada: apenas lembrar que, deste lado do Atlântico existe um povo que tem consciência de si próprio e da sua missão”. Recordo também “A História do Povo Açoriano” de Teixeira Dias, o primeiro mais voltado para a história política e social e o segundo para aspectos mais gerais da vivência insular ao longo dos séculos.
Nenhuma destas obras complementa outra. Elas são, por si mesmas, elementos essenciais para o estudo do que fomos e do que somos, aqui e no mundo.
Este “Descobrimento científico” leva-nos a ver de que forma os Açores foram ao longo dos séculos objecto de tanta curiosidade científica e de tantos estudos, um pouco por todo o mundo. Mais do que um livro para ler, este é um livro para ter e consultar. É fruto de anos de estudo e investigação e representa um esforço notável no enriquecimento dos conhecimentos adquiridos sobre os Açores. Para além de tudo, remete-nos para uma galeria de vultos e figuras grandes da ciência, nos Açores, ao longo dos séculos, com pormenores bio e bibliográficos, sóbria mas devidamente ilustrados, que ajudam de forma incisiva a “entrar” mais profundamente nos textos.
Aqui e apenas posso dizer isto: Esta é uma obra que enobrece e orgulha os Açores. Obrigado, Professor Luís M. Arruda!