E-mail para o Emílio Porto
Inicialmente, era apenas um e-mail que enviei ao Emílio Porto. Ele entendeu torná-lo público no jornal «O Dever», de 28 de Agosto de 2008. Recupero-o agora, neste momento triste, explicitando aquilo que então era implícito: o papel fundamental de Emílio Porto em todo esse processo, dirigindo, harmonizando, compondo.
E reescrevo-o ao som de «Montanha do meu destino», o poema de José Enes a que Emílio Porto deu a belíssima forma musical que conhecemos.
«Montanha da minha sorte
Oh! génio do meu viver,
Encomenda-me na morte,
quando me vires morrer.»
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Caro Emílio,
Recebi o vosso convite para a sessão dos 25 anos do Grupo Coral das Lajes do Pico.
Agradeço comovido e lamentando, magoadamente, não estar convosco nessa dia. Mas o Verão de 2008 reteve-me a Oriente. Daqui vos envio os meus parabéns e felicitações pela celebração de todo este tempo de trabalho e arte.
É verdade que 25 anos são uma ninharia (um grão de areia, diria Pascal), quando comparados com a idade da Montanha que vos fica aí defronte e que tão bem vos ficou nas palavras e na melodia com que vocês a celebraram no vosso segundo CD. Mas o tempo dos homens rege-se por outras medidas, como a sensibilidade e o gosto estético, a dedicação e o esforço; só elas permitiram que pudéssemos todos aceder a tantos e tão belos momentos de fruição artística, colectivamente partilhados, como deve ser toda a cultura autêntica, mas também prolongados no sossego e na intimidade de cada um, através dos registos que nos ficaram.
O Grupo Coral das Lajes do Pico tem um lugar reservado na história da cultura açoriana dos últimos vinte e cinco anos, a demonstrar que não é preciso estar nos grandes «centros» para se trabalhar com perfeição e qualidade (embora isso exija outras energias). A música popular dos Açores, a tradicional e a urbana, mas também a religiosa e a de outros universos culturais (Alentejo, Galiza, por exemplo) encontraram no Grupo Coral das Lajes do Pico um atento e afectuoso re-criador e divulgador, em cujo trabalho de direcção e vozes as palavras e as melodias ganharam novas formas e asas. Poetas e músicos têm razões de sobra para sentir-se gratos por tudo isso.
Nada disto é novo ou coisa que não soubesses, e não precisavas que eu to dissesse. Mas eu é que precisava de dizer-to. Em «tempo de festa».
Um grande abraço.
Urbano
Nota: Urbano Bettencourt, nascido nesta Ilha do Pico, no Calhau, freguesia da Piedade, município de Lajes do Pico, corria o ano de 1949. Licenciado em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa – é, desde 1990, Assistente Convidado na Universidade dos Açores, onde tem leccionado, entre outras, as disciplinas de Introdução aos Estudos Literários, Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa e Literatura Açoriana. Escritor, dono de um profícua produção literária na prosa e na poesia. O seu mais recente livro: “Que paisagem apagarás”