Pico, meu Pico, eis-te agora
como eu gosto de te ver,
a fronte dominadora
sem tristes véus a erguer!
Rasgou-se o manto cinzento
que envolvendo o firmamento
quási inteiro te escondeu,
e o teu talhe aprimorado
lá vou vendo desenhado
no límpido azul do céu!
…
Como eu te vejo, enlevada,
teu véu de ouro cobrir!
que linda cinta nevada
vem o teu cólo cingir!
Dize-me tu – não se acha
doce augúrio nessa faixa
de transparente, alvo tul’?
Não prediz ela bonança
num prado cõr de esperança,
num céu azul, muito azul?
Prediz-nos serenidade
no espaço, na terra e no mar;
fala-nos na suavidade
dumas manhãs d’encantar!…
Mas sombrio capacete
se acaso cobre, promete,
profetiza o temporal;
a guerra dos elementos,
a fúria solta dos ventos
destruidora, inda mal!
Mas hoje não é meu Pico
o profeta ameaçador!
hoje extasiada fico
diante do seu primor.
Hoje é lindo panorama
que as vistas atrai e chama
com atractivos sem fim!
toda a graça que apresenta
toda a beleza que ostenta,
tem sempre encanto para mim.
…
Ernestina Avelat,
in Ensaios Poéticos, Horta, Edição da Família, 1949,
Tiragem virtual de Davide Avelar, Nova Iguaçu, 2047.
Avelar, Amélia Ernestina Avelar (1849-1887), poeta, natural da vila da Madalena, ilha do Pico, residiu em Moçâmedes e em Luanda, Angola, e na cidade de Angra do Heroísmo onde faleceu.