Quem conhece o Ferreira Pinto, sabe que ele é homem de assumir as suas convicções sem medos nem eufemismos. Há pessoas que vieram a este mundo para comunicar pela palavra, outros pela escrita, o Ferreira Pinto veio para comunicar pela pintura. E é pela pintura que ele se assume como um ser intemporal algures numa linha de tempo.
Bem, é suposto nestas ocasiões apresentar o autor, e habitualmente costumamos ouvir os apresentadores dizerem que o autor é tão conhecido que dispensa apresentações. É o caso, mas mesmo assim, nesta matéria não pretendo ser muito parco em palavras. Não é relevante fazer aqui a história de vida do autor, mas é pelo menos importante que se faça o enquadramento da sua obra.
António Ferreira Pinto passou 26 anos em Angola e esse tempo marcou muito a sua pintura – as cores fortes, as cores quentes, a imensidade de cores diferentes, os contrastes bem marcados, os cheiros (sim a pintura tem cheiro) – tudo sensações que só quem passou por África consegue percepcionar em pleno. Foi um período em que ele passou à tela de forma muito vincada os 4 elementos da natureza – terra, fogo, água e ar.(…)
Desde 1975 Ferreira Pinto trocou África pela ilha de São Miguel. Aqui se radicou e aqui se dá a sua expansão de consciência. Começa a introduzir o elemento ilha – reduz a diversidade de cores, aumenta as variantes de verde, mas depressa vê a ilha para lá do tempo. A ilha é o seu ancoradouro, ponto de partida para outras linhas de tempo num universo que ele procura agora compreender. E é essa reflexão que ele sente uma enorme vontade de compartilhar com todos nós. Sente-se como que imbuído por uma energia que ele projecta para a tela através da qual nos transmite a sua visão do cosmos, da vida para além do nosso tempo. Donde vimos? Para onde vamos? Que estamos aqui a fazer? O autor questiona-se e encontra as respostas dentro de si mesmo, no mais profundo do seu íntimo onde afinal tudo começa e acaba. É isso que ele nos pretende transmitir à saciedade numa profusão de sucessivas telas. O que é o Tempo? Será que ele chegou à compreensão do Tempo? Penso que sim. Segundo Ferreira Pinto nós somos um grão de areia num Tempo no Tempo. Difícil este conceito, sem dúvida, mas basta percebermos que o tempo é uma ilusão e que só existe no nosso espaço e o nosso espaço é uma realidade que só existe porque se manifesta num tempo. (…) A pintura de Ferreira Pinto mostra-nos como as diferentes realidades coexistem no Tempo, como elas se doam para que delas emirjam novas realidades, em novas linhas de tempo todas elas no Tempo que é tão-somente o Aqui e Agora. É por isso que ele inicia uma série de galerias todas subordinadas ao tema genérico “Tempo no Tempo”, atribuindo depois a cada uma, uma temática mais agregadora; no caso presente descreve-a como “Transcendendo o Espaço e o Tempo” – uma obra composta por 21 quadros, na maioria inéditos.(…).
A obra desta fase, eu diria espiritual, obrigou a uma reorganização da sua paleta que agora se apresenta fundamentalmente em tons de dourado, rosa, prata e branco, de forma a poder transmitir-nos a Luz que irradia do universo, a Luz que é fonte da Vida, a Luz que nos sustém na linha de tempo em que nos encontramos e que nos está a conduzir para um outro Tempo. Dos quatro elementos que figuravam na primeira fase, o autor passa para o 5º elemento – o éter. Todas as formas expressão/pensamento ficam agora gravadas para a eternidade, impregnadas no éter.
Toda a sua obra aqui exposta tem uma mensagem que a trespassa de forma muito vincada e que eu sei que é muito cara ao autor ? Serenidade.(…)
O fio condutor da obra agora exposta é a ascensão do planeta. Mas o autor rejeita de forma consciente os arautos da desgraça e os falsos profetas. Vejam como a sua obra irradia calma e tranquilidade. Em alguns quadros vemos o caos, sim, mas mesmo nesses casos a Luz está sempre numa posição cimeira, triunfadora, qual farol que nos guia no meio da tempestade; o caos contém ele próprio a semente do renascimento, qual Fénix que renasce das cinzas. O caos atrevo-me a dizer que será tanto mais caótico, passe o pleonasmo, quanto mais assim o visualizarmos e o impregnarmos nas nossas células. Esta desmistificação pretende o Ferreira Pinto transmiti-la através da sua pintura.
Em Ferreira Pinto os mundos nascem e morrem numa trajectória de experienciamento que a vida, seja qual for a sua forma, física ou etérea, realiza. Cada mundo cria a sua realidade, nem certa nem errada, é a sua. Logo no primeiro quadro percebemos que há múltiplos caminhos, todos eles são “um” caminho, todos eles são “o” caminho, o universo é paciente, não tem pressa, a eternidade é mais um Tempo no Tempo de que nos fala o autor; assim o despertar das consciências se faz caminhando, cada um a seu ritmo, cada um a seu tempo, sem julgamento, apenas em pleno respeito pelo outro.
Esta exposição coloca à nossa frente um novo paradigma – a bonança. A humanidade está desestabilizada, confusa. Temos obrigação de pacificá-la. O Ferreira Pinto sente isso mais que ninguém, e por isso aqui está a sua obra a testemunhá-lo.
ESTÁ TUDO BEM!
Bem-hajas António!