FILÓSOFOS
Mário T Cabral, 25 de Janeiro AD 2015
Onde param os filósofos, em tempo onde tudo o que é especialista vai à televisão apresentar sua pedra filosofal? Porque não são eles convidados para debates, entrevistas, comentários, etc. e tal? Até aos anos 80 ainda estavam em moda – isto para não falar da França de Maio de 68, onde atingiram estatuto de estrelas de Hollywood! Agora, que já se percebeu que economia e política têm fundamento filosófico, faria todo o sentido ouvir os peritos do pensamento à séria.
Será que ainda há filósofos, pelo menos em Portugal? Será que ainda há jovens a optar por Filosofia no 12.º ano de escolaridade? Será que ainda concorrem aos cursos superiores de Filosofia? Quantos açorianos entraram este ano? Quantas faculdades de Letras ainda mantêm o curso?
É muito estranho que a Filosofia vá agonizando à medida que as democracias se instalam. Lembramo-nos logo de Platão, que considerava este o pior regime político, pois que nela se favorece a doxa, a opinião sem justificação científica, enquanto que o filósofo sério procura a episteme, a única opinião válida, isto é, a verdade. Talvez já não estejamos numa democracia, e não interessa mesmo nada aos plutocratas que as pessoas se libertem, pelo pensamento bem alicerçado, daquilo que eles apresentam com factos, mas que não passam de interesses pessoais, antagónicos ao bem comum.
É inacreditável como deixamos de saber pensar! Assusta ver a velocidade com que uma pessoa pode perder as suas capacidades lógicas e abstratas, em geral. É como deixar de ir ao ginásio. E é imensamente triste ver os seres humanos, que nasceram para as alturas do espírito, estarem reduzidas ao concreto imediato, supondo que a realidade é apenas isto: isto de fado, isto de factum.
Ao contrário do nosso tempo, a tradição cristã sempre abraçou a Filosofia, vendo nela uma arma poderosíssima na busca da verdade. Na Idade Média, chamavam-lhe a ancilla Theologiae: a “escrava da Teologia”, quer dizer, a serva, a enxada, digamos assim. A nossa tradição sempre uniu a razão à fé; Bento XVI tinha aqui um dos seus pratos fortes: quando a fé abandona a razão, torna-se fundamentalismo; e quando a razão abandona a fé, torna-se… isto que a gente vê no Ocidente contemporâneo: a ditadura do relativismo.
Se um dos tais filósofos ainda existentes (se os há) fosse à televisão, talvez tivesse a coragem de confessar que tudo começou há muito tempo, há cerca de dois séculos, ou mais, quando a verdade foi posta em questão. As ideias têm consequências, embora estas levem tempo a manifestar-se. Os filósofos só aparentemente parece que são cartas fora do baralho; entretanto, estão a ensinar os seus alunos, nas universidades; entretanto, estes saem e vêm ensinar os seus alunos para os liceus; entretanto passou-se mais de meio século, que a vida é assim mesmo. E quando a asneira acontece, a culpa não é de ninguém. Pudera! O culpado já está morto e enterrado!
Talvez que muitos dos filósofos que ainda vai havendo sejam os próprios a recusar aparecer na praça pública. Eles não são parvos e sabem que levaram décadas a ensinar os princípios teóricos de muita asneirada que vemos agora ser concretizada: os ideais comunistas, que deram no que deram, e que ainda esperneiam, na moral; e Nietzsche, e Freud, e Heidegger….
Os alemães não lecionam estes autores. É que, quer a gente queira quer não, ainda vamos tendo cabeça e “Quando a cabeça não tem juízo / O corpo é que paga”. Coitado do corpo que, quando paga, sabe lá porque é que paga. Pensa que faz parte da vida pagar.