FLORIANÓPOLIS 336 ANOS. PARABÉNS.
Arante Monteiro
Dizem que nossa cidade está comemorando 285 anos neste mês de março. Há controvérsias. Muitas festas de “feliz aniversário” estão acontecendo por toda parte em homenagem a esta data numa exaustiva programação que encerra hoje,31 de março. Mas não é bem assim, nossa cidade é mais idosa do que se diz por aí.
Os registros mais antigos da ocupação do litoral de Santa Catarina, incluindo a ilha, datam de aproximadamente seis mil anos. Os Sambaquis estão espalhados por todo litoral catarinense. As inscrições rupestres provam da existência de uma população pré-histórica, que habitava o litoral catarinense. Os índios carijós, que também são guaranis, ocuparam toda essa região e chamavam a ilha de Meimbipe,” coisas erguidas sobre água”. Alguns historiadores dizem que eles chamavam a ilha de Y-jurerê mirim, “boca pequena de água”.
O navegador Juan Dias de Solis foi um dos primeiros europeus a aportar na ilha, em 1516. Os europeus conheciam a ilha como Ilha dos Patos, tantos desses bichos que existiam por aqui.
Em 22 de novembro de 1526, o navegador veneziano Sebastián Caboto, a serviço da Espanha, deu a Ilha dos Patos o nome de “Isla de Santa Catalina”. Se diz também que foi uma homenagem a sua esposa, que se chamava Catalina de Medrano. Como o batismo da ilha deu-se com data anterior a da comemoração da Santa, 25 de novembro, a hipótese de Caboto ter homenageado sua própria mulher é mais provável. Mas pela proximidade das datas também é bem provável que quisesse homenagear as duas, sua mulher e a Santa Catarina. O fato é que Sebastián Caboto não era português e o nome era espanhol, Isla de Santa Catalina.
O inicio verdadeiro da póvoa começou com a vinda de José Pires Monteiro, em 1673, que veio de São Vicente (São Paulo) instalar um empreendimento agrícola. Seu pai, Francisco Dias Velho, com empregados, escravos e família chegou em 1675 para comandar os trabalhos, inclusive de aprisionamento dos índios. Quando chegaram já existia até uma cruz onde hoje é a Catedral. Assim surgiu a póvoa de Nossa Senhora do Desterro. Estas sim são as datas que deveriam ser consideradas para o nascimento da cidade, 1673 ou 1675. O nome Desterro não tem nada a ver com degredados vindos de Portugal, prisioneiros a mando do rei, como muitos dizem por aí. Nossa Senhora do Desterro é a representação bíblica da fuga para o Egito, ou seja, José, Maria e Jesus buscando abrigo em outras terras, fugindo de Herodes. Na Itália e no Brasil é a padroeira dos imigrantes e se comemora no dia 17 de fevereiro. Portanto também deveríamos comemorar o dia 17 de fevereiro como aniversário da cidade, e não 23 de março.
Em 1689 Francisco Dias Velho foi morto em um ataque de piratas ingleses, mas cerca de vinte famílias deram continuidade ao povoamento.
Em 1726 a então póvoa passa a ser Vila de Nossa Senhora do Desterro. Esta é a data oficial da certidão de nascimento da nossa cidade. O aniversário que ora se comemora é considerado a partir dessa data. É como as pessoas faziam antigamente, nascia o filho e só depois de muito tempo é que se ia ao cartório fazer o registro. Aconteceu com meu pai, que já tinha quase trinta anos quando meu avô foi fazer o registro dele na Freguesia do Ribeirão. Registrou como se tivesse 18 anos para poder se alistar no exército. Até hoje só se comemora a idade do papel de registro e não a verdadeira de nascimento. Assim é a idade da nossa cidade, nasceu bem antes mais só foi registrada bem depois. Aliás, esta data, 23 de março, refere-se ao ano em que a povoação de Desterro foi desmembrada de Laguna, elevando-se a condição de Vila.
Em 1738 a Coroa Portuguesa criou a Capitania da Ilha de Santa Catarina. José da Silva Paes é o primeiro governador. Inicia a construção dos fortes e povoamento do litoral com colonos vindos dos Açores (1748-1756). São seis mil pessoas que aqui chegaram, das quais quatro mil e quinhentas se fixaram em Santa Catarina e as demais foram para o Rio Grande do Sul até ao Uruguai. A rua dos Ilhéus, no centro da cidade, as Freguesias de N.S. da Conceição, São Miguel da Terra Firme, Rosário da Enseada do Brito, de São José da Terra Firme, de Nossa Senhora das Necessidades e Santo Antônio, são testemunhas dessa época.
Em 1889 o Brasil vira República e Floriano Peixoto assume a Presidência em 1891. Sem eleições nos anos seguintes provocou, então, movimentos revoltosos no Brasil. No Rio Grande do Sul iniciou-se a Revolução Federalista e no Rio de Janeiro a Revolta da Armada. O movimento que se opõe a Floriano Peixoto instala o Governo Provisório da República.
O Estado, então, foi separado da União. Mas por pouco tempo.
Em 1894 o Coronel Antônio Moreira César desembarca na Ilha como Interventor, com quinhentos homens. Presos os revoltosos serão todos fuzilados na Ilha de Anhatomirim. Até hoje há divergências no número exato de fuzilados. A história mais conhecida tem cerca de 185 nomes, entre eles o Marechal de Almeida Gama Lobo D’Eça; o Barão de Batovi; o Capitão de Mar e Guerra Frederico Guilherme de Lorena e muitos outros.
Os republicanos vitoriosos realizam eleições em 1894 e elegem Hercílio Luz. Este toma posse em 28 de setembro daquele ano e no dia primeiro de outubro sanciona a lei n° 111 que muda o nome da capital catarinense para Florianópolis, que quer dizer “Cidade de Floriano”. Esta decisão, portanto, gera polêmica até hoje entre os moradores, pensadores e estudiosos. Portanto, a mudança do nome nunca foi bem assimiliada pela população local.
Segundo o historiador Carlos Humberto Correa, quem propôs o nome de Florianópolis foi o desembargador Genuino Firmino Vidal Capistrano. Mas outras sugestões de nomes já apareciam desde 1888: Ondina, Baía Dupla, Nossa Senhora da Baía Dupla, Boa Vista, Ponta Alegre, Redenção, foram os nomes debatidos.
É isso aí, um pouco de nossa história. Meimbipe, Ilha dos Patos, Ilha de Santa Catarina, Póvoa de Nossa Senhora do Desterro, Vila de Nossa Senhora do Desterro, Florianópolis. Muito obrigado Florianópolis. Muito obrigado Floripa por nos ter acolhido e nos ter aturado por todos esses anos. Parabéns pelo seu aniversário, seja lá qual for a sua verdadeira idade.
Acho, portanto, que são 336 anos.
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Nota: O autor,Arante Monteiro,”o Arantinho”, é historiador, colunista do Jornal “O Carona”,líder da comunidade do Pântano do Sul,uma das vozes mais retumbantes na defesa da cultura açoriana na Ilha e no litoral de Santa Catarina. É vice-presidente da Casa dos Açores Ilha de Santa Catarina. O restaurante “Arante”(propriedade de sua família) no Pântano do Sul está classificado como um dos melhores do Brasil na cozinha típica regional e ponto de encontro de todos quantos visitam Florianópolis atraídos por sua beleza e pelo legado cultural açoriano.