Trabalhemos para que o serviço público seja uma
carreira repleta de regozijo e perspicácia.
John F. Kennedy, 35º Presidente dos EUA
Se a politica não é uma ciência exata, mas uma arte, como disse, repetidamente, o estadista e diplomata alemão Otto Von Bismarck, então a nossa comunidade de origem portuguesa no estado da Califórnia tem a virtude de possuir alguma “arte politica”, já que desde os primórdios da nossa emigração que temos estado presentes no mundo político deste colossal estado americano. Apesar da nossa desvigorosa organização politica, e de sós, numericamente falando, não termos a potencialidade de eleger luso-descendentes para cargos políticos, temos tido, através dos anos, uma frequência muito respeitável no mundo político deste estado plantado à beira do Pacífico. Porém, o século XXI, que corre a passos largos, requer outros paradigmas e daí a importância da comunidade se organizar em termos políticos. A recém-criada Califórnia Portuguese-American Coalition (CPAC), que tem o patrocínio e apoio basilar da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) é, indubitavelmente, a solução que precisamos. Constituir um projeto político na nossa comunidade; fazer sentir-se a importância do serviço publico às novas gerações; criar condições para que mais luso-descendentes, independentemente das suas tendências politicas, tenham voz no processo e gerar mecanismos para termos oportunidades de construirmos mais pontes com outras etnicidades, são processos fundamentais para a nossa sobrevivência em terras californianas. É que tal como escreveu algures o escritor italiano Cesare Pavese: a política é a arte do possível. Toda a vida é politica.
Longe estão os anos, em que tal como escreveu Al Graves no seu livro California’s Portuguese Politicians—a Century of Legislative Service, também este com o patrocinio da FLAD e publicado pela Portuguese Heritage Publications of California (PHPC), o jornal União Portuguesa anunciava, entusiasticamente,a 145 de Novembro de 1900, a eleição de John G. Mattos para a Assembleia Legislativa. Desde então, e ultrapassados 117 anos, temos tido uma amalgama de legisladores luso-descendentes. Mas a nossa presença não passa meramente pelos hemiciclos em Sacramento. São várias as câmaras municipais, os distritos escolares, os “Board of Supervisors” dos condados deste estado e outras comissões locais e regionais com elementos luso-descendentes. Segundo dos recolhidos pela CPAC, num esforço começado há menos de um ano, estão devidamente identificados 77 luso-eleitos, servindo a Califórnia nos mais variados cargos políticos deste estado. Mais, como é sabido o Vale de San Joaquim, mais concretamente o Centro do Vale, é a única zona nos Estados Unidos onde os três congressistas são luso-descendentes: Jim Costa, Devin Nunes e David Valadão. Os primeiros dois, netos de emigrantes açorianos, e o terceiro filho de emigrantes dos Açores.
Se há que regozijarmo-nos que com uma população e luso-descendentes que ronda 400 mil pessoas, num estado com praticamente 40 milhões de habitantes, temos uma presença impressionante, particularmente a nível federal, não é menos importante recordarmos que o que foi feito, aconteceu, na vastíssima maioria sem qualquer apoio ou organização da nossa comunidade, o que facilmente nos leva à conclusão que, com um plano estratégico, com as sinergias do nosso movimento associativo, e a nossa capacidade de criarmos ligações à multitude de grupos étnicos que compõe o multiculturalismo californiano, as nossas potencialidades apenas começaram a despontar. O século XXI será o século da presença de homens e mulheres de origem portuguesa no mundo politico californiano. A recente eleição de Cecília Aguiar-Curry para o Assembleia, onde há anos não tínhamos uma presença lusa, é apenas o começo de um movimento comunitário unificador, independente da cor politica, para que com cada eleição haja um crescimento no número de luso eleitos a todos os níveis, porque tal como disse algures o antigo dirigente da Câmara dos Representantes, Tip O’Neil: toda a politica é local.
As comunidades de origem portuguesa no estado da Califórnia, espalhadas desde Arcata a San Diego, possuem imensas potencialidades no mundo político. Se alicerçarmos o nosso legado cultural, a nossa história de povo navegante aliada à nossa aptidão pelo agrupamento de culturas, a nossa abertura ao mundo, o nosso espírito de solidariedade e o nosso sentido de justiça social teremos os ingredientes certos para formamos, com as outras etnias, as coligações necessárias para colocarmos em cada comunidade, um/a candidato/a luso-descendente aos distritos escolares, aos distritos de saúde e obras públicas, às câmaras municipais, às câmaras dos condados, à assembleia estadual, ao senado e daí passar-se para cargos executivos estaduais ou cargos legislativos nacionais. As possibilidades existem. Uma maior presença política, de luso-descendentes, no mundo americano é perfeitamente plausível e exequível. Falta o planeamento estratégico que a CPAC, com o apoio da FLAD, e da nossa comunidade, pode e dever efetuar. É que tal como afirmava constantemente William James: devemos agir como que o que construímos fará a diferença, porque na realidade faz.
Há cerca de um ano, mais concretamente em março de 2016, no consulado geral de Portugal em São Francisco, foi lançado o projeto CPAC. Um ano mais tarde, está a ser planeada, para 5 e 6 de junho do ano em curso, a primeira cimeira da CPAC. Um evento na capital californiana que envolverá os luso-eleitos e a nossa comunidade, particularmente quem esteja interessado em candidatar-se a um cargo politico. Em Sacramento, junto do capitólio, onde precisamos ter uma maior comparência e mais influência, reunir-se-ão membros da nossa comunidade, das várias gerações, interessados em impulsionarem um novo ímpeto na presença de luso-eleitos. É um projeto ambicioso! Há quem diga que é mesmo utópico! Diria que é uma utopia necessária. Mais do que uma quimera, uma nova era na história da nossa presença no serviço público californiano equivale-se ao que Confúcio é citado como tendo dito: acender uma candeia é muito melhor que que passar a vida a blasfemar a escuridão.
Parafraseando John F. Kennedy, chegou o momento para os luso-descendentes não perguntarem o que é que a comunidade pode fazer por eles, mas sim o que é que eles podem fazer pela comunidade. Enveredar pelo serviço publico, forjar coligações com outras etnias e outras culturas, colocar a nossa presença na praça pública californiana será, certamente, a forma mais eficaz para perpetuar o nosso legado cultural neste estado que também ajudamos, diariamente, a construir. Tal como Leo Tolstoy acredito que a vocação de cada ser humano é servir os outros. A melhor analogia que temos, foi-nos dada pelo antigo vice-presidente americano Joe Biben numa alocução feita na Universidade de Syracuse, durante a qual relembrou-nos que na realidade temos duas opções: ou cruzamos os braços e nada fazemos, ou pegamos na história com as nossas próprias mãos e como nenhuma outra geração, trabalhamos e moldamos, insistentemente, até que se crie um mundo melhor.