Inesquecível Daniel,
… atrevo-me a adivinhar que os dizeres abaixo transcritos rimam com a autenticidade humanista do teu itinerário cívico-religioso:
“El más feliz de mis dias será aquel en el que pueda dar mi vida por ustedes.”
Confesso, caríssimo, que não me sinto ainda completamente refeito para restituir a voz ao meu silêncio. Mas estou aqui, Daniel, porque a nossa derradeira (inesquecível) conversa telefónica continua a gravitar na minha atribulada memória emocional.
Ó Céus! Foi naquela quinta-feira, 23 de Maio (quando ainda me encontava em trânsito na costa leste dos E.U.A.) que resolvi estabelecer contacto telefónico com a ‘tua/nossa’ Maia, para a habitual conversa com os estimados Danialice (Daniel & Alice). Naquela altura, depois de uns breves minutos a escutar os prudentes comentários de Maria Alice sobre a preocupante situação da tua saúde, aconteceu que a Providência teve pena de nós ambos: depressa sentiste a energia suficiente para agarrar o telefone, oferecendo uma auspiciosa claridade de esperança à nossa breve conversa… De repente, senti-me aprendiz d’alegria, a estudar o gelo num dia de calor…!
Daniel – meu estimado ‘António Vieira’ da açorianidade: desde o passado “Memorial Day”, a Lubélia e eu ficámos enlutados. Ficámos ambos em relativo silêncio…
Longe de mim esteja o gratuito despudor de refrescar esta conversa com referências ao nosso comum itinerário pioneiro politico-parlamentar. Cada percurso tem o seu discurso próprio. O preço do dever cumprido é a mudança. Antes de conviver com escritor Daniel de Sá, recordo ter tido a ventura de apreciar muitas das crónicas subscritas por Augusto Vera-Cruz. Aliás, seria descuido gratuito comparar o ‘pão-de-milho’ dos meus dizeres com a ‘massa-sovada’ do teu testemunho artístico-cultural.
Haja Eternidade, precioso Daniel… Há anos aprendi que o teu nome (em hebraico) significa “God is my judge”. Sempre que medito no teu ilustre itinerário académico-religioso, admito sentir momentos dum benigno ciúme. Explico-me: na nossa juvntude, ambos passámos mais de três anos longe do torrão natal: foi pena que a tua valiosa experiência de estudante-missionário em Valencia (Espanha), não tivesse podido minguar a ignorância involuntária deste teu amigo, feito guerrilheiro-amador da confraria colonial, porventura desperdiçado em terras moçambicanas…
Entretanto, inesquecível Daniel, conseguiste o ‘visto” do Criador no teu passaporte de emigrante. A humanidade continua na busca de respostas credíveis para sossegar as suas desperadas perguntas. Todavia, continuo convencido de que o Criador vai aspergindo a luz divina sobre o universo, à maneira que a visão humana consegue tolerar tamanha luminosidade…
Daniel, querido Amigo: vou interromper esta homilia fraternal com um abraço de condolências aos teus familiares, nomeadamente, tua esposa, Maria Alice (reconhecida irmã-gêmea da dignidade humana).
Até logo!
João-Luís de Medeiros
(Rancho Mirage, Caliornia – USA)