Humberta Araújo
The Remarkable Adventures of Portuguese Joe Silvey e Stanley Park’s Secret duas obras de interesse histórico para ter em conta por quem se interessa pela saga da emigração açoriana para o Canadá.
The Remarkable Adventure of Portuguese Joe Silvey publicada em 2004 é o primeiro trabalho de Jean Barman abordando a problemática da emigração açoriana para a Colúmbia Britânica. No prefácio desta obra escreve Manuel A. Azevedo: “Existe um provérbio português que diz que Deus está em todo o lado, mas os portugueses chegaram lá primeiro”.
Uma interessante observação sobre o trabalho de uma investigadora canadiana, que tem dedicado estes últimos anos à descoberta da herança portuguesa neste país. Joe Silvey (Silva) foi um dos primeiros pioneiros portugueses a chegar ao Canadá, muito antes de 1867, o ano da Confederação à qual a Colúmbia Britânica se juntou em 1871.
O ano da publicação desta obra de Barman é também relevante para a história portuguesa neste país: comemorava-se os 300 anos do primeiro carteiro, o português Pedro da Silva.
A história do picoense Joe Silvey iniciou-se durante a corrida ao ouro de 1858 na Colúmbia Britânica. Estes foram os anos em que a população não nativa cresceu do dia para a noite. As 1000 almas que habitavam a Colúmbia Britânica viram de um momento para o outro o seu lugar “inundado” por sonhadores à procura de riqueza. Em pouco tempo a população somava 20 000 pessoas. Todavia, o picoense Joe Silvey não encontrou fortuna no ouro mas encontrou uma esposa nativa da localidade que mais tarde ficaria conhecida por Vancouver. Silva casou então com Khaltinaht, neta do lendário chefe índio Kiapilano. Após o matrimónio, o casal partiu de canoa rumo a Point Roberts onde José Silva abriu um bar (saloon) e se dedicou à pesca. Viveu em Brockton Point, a actual Stanley Park, localidade onde acabaria por encontrar outros companheiros de língua, entre eles, o baleeiro Peter Smith, Joe Gonsalves e o primeiro polícia de Vancouver, Tomkins Brew. Todos eles, com excepção de Gonsalves, que permaneceu solteiro – casaram com mulheres aborígenes.
Algum tempo depois Silva ficava viúvo e com duas crianças. Acaba mais tarde por casar com outra mulher indígena – Kwahama kwatlematt (Lucy-Lucia) e juntos criam 11 filhos, na ilha Reid. José Silva nunca mais regressaria à sua terra Natal – o Pico. The Remarkable Adventures of Portuguese Joe Silvey contém ainda uma importante colecção fotográfica da baleação açoriana e canadiana e, uma relevante memória fotográfica da família Silvey.
Stanley Park’s Secret é outro trabalho que completa os esforços de Jean Barman para tornar viva a história portuguesa na Colúmbia Britânica. Esta é uma obra mais abrangente que recorda também as famílias esquecidas do Rancho kanaka, Brockton Point e Whoi Whoi.
Mas quem foi Joey Silvey?
José da Silva que renasce agora através do entusiasmo de Jean Barman e dos seus descendentes espalhados por diversas regiões da Colúmbia Britânica, era um baleeiro do Pico, que em 1850 chegou ao Canadá atraído pela febre do ouro. O ano do seu nascimento continua uma incógnita – 1830?.
“Mesmo o nome Joe encontra-se envolto em algum mistério. Originalmente o seu nome de família seria Silva. Mas porque não sabia escrever alguém teria de fazê-lo por ele. Sempre que necessário complementaria a assinatura com um X para comprovar a autenticidade do que estava a ser assinado. Documentos mais recentes mostram o seu nome escrito tal como seria ouvido: Silva, Silvy, Sílvia e Silver. Por vezes a mesma pessoa escrevia o seu nome de formas diferentes. É possível, mas não provável que alguns destes documentos se refiram a outras pessoas. O nome só gradualmente tomou a forma de Silvey,” escreve a propósito Jean Barman.
As memórias mais vividas de Joe Silvey surgem da boca da sua filha mais velha Elizabeth, que já em idade avançada, as revela ao arquivista da cidade de Vancouver, o Major J.S. Matthews. Os seus encontros tiveram lugar de Outubro de 1938 a Outubro de 1943. Um ano e meio depois Elizabeth falecia. A filha deste picoense tinha igualmente uma importante colecção de fotos que são agora parte dos arquivos da cidade de Vancouver. De acordo com os registos canadianos do casamento, Joe Silvey era filho de João e Francesca Hyacintha. No Pico, a infância de Silvey deve ter sido povoada por relatos de viagens para a América no “Morning Star”, um navio que regularmente empregava jovens do Pico. Esta teria sido a embarcação na qual Silvey navegou para as Américas. A extraordinária história de José Silva leva-nos a admitir a possibilidade de ele ser neto de um escocês chamado Simmons. Ainda de acordo com Barman existiu um capitão baleeiro que saiu de Massachusets durante os anos 50 do século XIX. Apesar do seu nome (possivelmente uma variante do português Simões), Simmons era português de nascimento.
Uma segunda versão da história liga o nome de Joe Silvey a um dos soldados enviados pela Inglaterra para Portugal em 1808 para combater os franceses durante as guerras Napoleónicas. Alguns soldados decidiram ficar pelos Açores. Assim se poderá falar de uma herança escocesa e do facto de Joe ter uma pele mais clara que a portuguesa. De acordo com um dos seus descendentes, quando um Silvey deixa crescer a barba, a sua cor é vermelha. O registo da família diz que Joe tinha os olhos azuis e o sue filho Henry, verdes. Esta herança, escreve Jean Barman referindo-se a um trabalho dos investigadores Davis, Gallman e Gleiter publicado em 1995, pode explicar as razões pelas quais num documento oficial de compra de terras em 1872, Joe terá dado como seu nome legal o de ‘Joseph Sílvia Seamans.’
Aos 12 anos Joe Silvey começava as suas aventuras. Entre 1840 e inícios de 1850 o seu pai João decide levar dois dos seus filhos para a faina da baleia. Joe jamais voltaria a ver a sua mãe nem a ilha do Pico.
A sua chegada ao Canadá é uma incógnita. O ano de 1860 é o mais plausível sendo aquele referido pelo próprio.
Humberta Araújo reside em Toronto, Canadá. Licenciada pela Universidade Queen’s, Ontario, Canada em Relações Internacionais tem-se dedicado à temática da imigração com algumas obras a publicar. Jornalista há 25 anos, passou pela RTP Açores (11 anos) assim como pelos jornais Açoriano Oriental e Correio dos Açores para além da rádio, Asas do Atlântico e Rádio Açores TSF. É actualmente editora do Semanário Nove Ilhas em Toronto. Publicou já duas obras de literatura infantil, estando um dos seus contos infantis a ser adaptado pela RTP. Prepara para publicação em inglês uma obra de ficcão sobre a vida de Cristovão Colombo na sua juventude e uma série de entrevistas a mulheres emigrantes que regressaram aos Açores.