Balada para uma sereia morta
Esta noite!, esta noite!…
Chorou, cantou, chamou
Perdida, loucamente uma sereia!…
Inteira era a dor, inteiro era o pranto
Da pobre sereia no seu frio manto
De falsas estrelas, mais de lua cheia
No mar… a chorar.
Esta noite!, esta noite!…
Desesperadamente, cantou uma sereia
Por negros rochedos, cheios de bruxedos
Apenas se ouvia sua voz de magia
Tão só e plangente em canto pungente
Mas ninguém… ninguém a quis escutar!
– Ah!, marinheiro, de barco sem Norte
Porque não paraste, porque não te deixaste
Por ela enfeitiçar?…
Esta noite!, esta noite!…
Chorou, cantou, chamou uma sereia
Em espuma de oiro se desfez o seu cabelo
E tornou mais salgado o gosto da maresia
Com choro tão triste, tão dobrado pranto…
Mísera sereia perdida, diluída em suave melopeia
Que ninguém… mesmo ninguém quis escutar!
Esta noite!, esta noite!…
De canto magoado, desfez-se em água, em névoa
Em bruma, a alma duma sereiazinha…
Tão pequenina, tão pobre, e sozinha que nem o mar
Nem o mar!, quis consolar, a quis aceitar…
E o coração, já morto e desfeito, da pobre sereia
Pela maré-cheia veio rolar na praia
Só, para enterrar…
Esta noite!, esta noite!…
Morreu uma sereia! De tanto cantar…
– Ah!, marinheiro de tão negra sorte
Quem te há-de, um dia…
Perdoar?…
Lúcia Costa Melo, Rota Sibilina, Vila Franca do Campo, Ed. Ilha Nova, 1984.