(Henri-Edmond Cross, 1856-1910)
‘Garden’ – Watercolor on paper
Ode Anacreôntica
Descansemos, Anarda, neste sítio
Que a bela Natureza fabricou
Para amantes ditosos descansarem;
Aqui entre estes lírios,
C’os peitos inflamados,
Gozaremos do campo esta frescura.
Vê como deste trémulo regato
Vão as águas aos olhos fugitivas
Cortando a verde relva destes prados,
Fazendo nos seus giros
Matiz tão agradável
Que parece cristal entre esmeraldas.
No ar que aqui nos cerca se derrama
O suave perfume de mil flores
Que dentre a branda relva estão brotando;
Junto das águas nasce
A cândida Açucena,
O suave Jacinto, a pura Rosa.
Vê como dos Amores, uns, pendentes
Pelos ramos das árvores frondosas,
Derramam sobre nós nuvens de flores;
Outros aqui mais perto,
Batendo as leves asas,
Mais acendem o fogo em nossos peitos.
Não ouves a sonora melodia
Dumas vozes que ao longe vão soando?
São as Ninfas formosas deste bosque,
Que ao som de doces hinos,
De lírios e de mirto
Nos fabricam grinaldas para a fronte.
Oh, quanto feliz sou quando contigo
Gozo tanta frescura deleitosa!
Mas quanto mais feliz e venturoso
Se o meu triste rival
Ouvisse esses suspiros
Com que premeias meu ardente amor!
Manuel Inácio de Sousa,
In: Francisco Topa,
Poesias dispersas de M. Inácio de Sousa, Porto, Ed. do Autor, 2001.
Manuel Inácio de Sousa (1739-1801) advogado, comerciante, poeta, natural da cidade da Horta, ilha do Faial, onde viveu, trabalhou e faleceu.