Miragem1
Como se Deus à límpida corrente
Tivesse abandonado uma camélia,
Ou das margens caísse suavemente,
Banhada de luar a loira Ofélia,
Assim eu deparei, amor, boiando
Tua imagem na onda rumorosa:
Depunha-te no rosto, fino de armando,
Um beijo de oiro a trança vaporosa…
Porém, ao contemplar-te a miniatura
Da insinuante, harmónica figura,
Um místico receio me envolveu…
E olhando o firmamento marchetado
De rútilas estrelas, com cuidado,
No alto procurei o olhar teu…
Coimbra, Fev. – 1917
Duarte de Viveiros
Duarte José de Viveiros (1897-1937), advogado, poeta boémio, nasceu na ilha de S. Miguel e viveu quase sempre em Lisboa onde faleceu.
1. Transcrito de Alma Académica, jornal estudantil, em Açores, “Encontro”, Ponta Delgada, 25.04.1963.