Nos 30 dias da tua morte
Carta sem selo
Caríssimo Sá Couto!
Tabraço!
Pensavas que me esquecia! 13 de Maio, com Maria (foste da Congregação Mariana, mais eu) e agora o 13 de Junho, com Santo António, a abrir aquela quadra de matriz popular que tanto te dizia! Pensavas que me esquecia! Nem penses! Tu que partiste sem nada me dizer, a não ser aquele mail com um “não te preocupes comigo” agora tens de ouvir… Não sei como é isto de “ouvir” quando se está numa dimensão diferente, mas sei que ouves!
Comigo, dentro de mim e com recordações que só tu sabes, desde que fomos crianças e saímos de ser crianças, mora a tua irreverência. Mora o teu feitio quezilento, desinquietador e impulsivo. Às vezes davas-me raiva! Poucos como tu souberam e saberão conjugar sentimento com razão! Quando a gente pensava que estavas no nosso lado da argumentação ou do sentimento, a tua Filosofia, do saber e da vida, surpreendia-nos com um ângulo diferente. E tudo começava de novo. Ninguém tinha força de se opor às tuas opções. Mas tu tinhas força para fazer da tua vida algo de muito teu, em que todos cabiam. E isso sempre me encheu de alegria.
Há dias, deram-te uma insígnia. No dia dos Açores! Com toda a justiça! Eu chorei! Acredita! Chorei porque já me senti na fronteira da luz branca que nos enche de paz indiferente ao lado de cá ou de lá onde vai prosseguir a nossa existência. Eu voltei. Tu não voltaste! Deixaste-nos apenas o teu sorriso final. Mas eu estava a falar de uma insígnia. Pois! Se tivesse acontecido comigo (o que na lei das probabilidades seria como um euromilhões sem ter apostado nele) tu dirias logo que aquilo cheirava a “ encomenda cívica”! Sim, porque também há a “encomendação religiosa”, à hora da sepultura.
É que tu, meu caro Sá Couto, estavas doente há muito tempo. Os méritos do teu saber, da tua intervenção cívica, da tua convicção política, do teu amor à terra que te viu nascer, da tua Lomba da Maia, da Tua Senhora do Rosário e dos teus Lausperenes, das tuas festas do Linho e dos teus sabores populares, não cresceram nem apareceram neste último ano… Mas esperaram que partisses para te honrarem.
Para mim és o exemplo da distracção em que vivem muitos dos nossos governantes. Só reparam na pessoa depois de ver a extensão do seu funeral. Era o que me dirias!
Por isso mesmo, passados estes 30 dias, a ti que já te encontraste com o nosso Daniel de Sá, só tenho a dizer-te uma coisa, como ainda há pouco me dizias: espera por mim! Não sei que a que horas, mas estarei à tua porta para mais um jantar de compadres… ou será almoço de Amigos? Eterno?
Pois claro que sim! Neste abraço!
Santos Narciso