Obrigada, seu Salim.
Quando amigos e admiradores do escritor Salim Miguel comemoram o aniversário de 90 anos do nosso grande ficcionista, uno-me a essas vozes para dar os meus parabéns e, sobretudo, para dizer: Obrigada, seu Salim, por sua escrita admirável, por sua história de vida e por uma lição de amor à Florianópolis e à cultura que o senhor me ensinou no momento de transição do cargo de Superintendente da Fundação Franklin Cascaes, no dia 2 Janeiro de 1997. Era uma tarde de quinta-feira e, tendo à frente o seu exemplo, iniciava o meu caminhar determinada em empreender com vigor ações culturais voltadas na promoção da cidadania e qualidade de vida e em consolidar uma política cultural fundamentada na identidade, na diversidade e na valorização do referencial cultural de Florianópolis.
Conheci Salim Miguel quando era Diretor da Editora da UFSC, uma gestão dinâmica e incansável no desenhar de um norte editorial inovador, ensejando uma política de difusão literária eficaz e efetiva.
Sua trajetória de vida se confunde com a história cultural de Santa Catarina desde a criação do irrequieto e idealista Grupo Sul (1947-1958) que sacudiu a mesmice da provinciana Florianópolis fechada aos ventos modernistas que sopravam pelo Brasil. Uma verdadeira revolução cultural que se alastrou pelo universo da criação artística – literatura, artes plásticas, teatro e cinema, revelando os novos valores e ideias, principalmente na literatura e nas artes. Como não lembrar a ousadia do Grupo Sul de fazer o primeiro longa-metragem catarinense “O Preço da Ilusão”, rodado em Florianópolis em 1957, uma verdadeira crônica da cidade? Ao lado de Salim Miguel e de sua mulher, a escritora Eglê Malheiros, companheira de toda uma vida, nomes ícones da cultura catarinense, arquitetaram este novo olhar voltado à vida real, à crítica social no desvendar os conflitos morais e sociais, sob e em qualquer circunstância.
Pena consagrada, uma produção literária profícua com mais de trinta títulos publicados. Salim Miguel é uma referência na literatura brasileira, o que lhe valeu o merecido reconhecimento com a outorga em 2002 do Troféu Juca Pato como “Intelectual do ano”, segundo a União Brasileira de Escritores e a Folha de São Paulo e o título de Doutor Honoris Causa da UFSC e, em 2010, o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra.
Li o seu premiado e excelente romance Nur na escuridão, em que narra a saga de sua família desde o Líbano até o Brasil, a terra do acolhimento e o estabelecimento em Santa Catarina. Mais do que uma história de família, seu Salim brinda-nos com uma narrativa rica no humanismo de seus personagens, no imaginário enraizado e expandido, nas vivências múltiplas, nas experiências dos emigrados na sua longa história de andanças neste atravessar fronteiras em busca do seu lugar. Salim Miguel faz isso com grande sensibilidade no seu labor literário navegando entre o real e a ficção, na mobilidade cênica – o retornar à terra de seus ancestrais e ir ao encontro de seus “Eus”. A transnacionalidade cultural e histórica ficcionada em Nur na Escuridão é uma via de conhecimento da representação identitária de um povo que pelos caminhos da diáspora e uma grande contribuição à Literatura de Emigração/Imigração.
Salim Miguel e sua obra – Patrimônio Cultural de Santa Catarina.
Por tudo isso, obrigada seu Salim.
Lélia Pereira da Silva Nunes, escritora.
Nota: Foto Salim Miguel,cedida pelo cineasta Zeca Pires.