Inverno rigoroso, manhã escura e fria,
Manhã tempestuosa, rugia o vendaval;
Soprava rijamente o vento, o mar bramia,
As rochas açoitando, varrendo o areal.
Em luta os elementos, de negro o Céu forrado,
Cuspia contra a terra gelados aguaceiros;
A rubra goela abrindo mostrava, incendiado
O seio donde partiam descargas e morteiros.
Do mar flocos d’espumas de longe arremessados
Batiam nas vidraças que o vento sacudia;
Ruídos do Oceano, da chuva nos telhados,
Da infrene trovoada, do norte que gemia.
Foi ao som deste concerto que nasci,
Foi à luz desta tormenta que a luz vi.
Palmira Jorge,
In O Telégrafo, “Poetas desconhecidos”, Horta, 20.12.1966.
Jorge, Maria Palmira dos Santos (1872-1956) professora, poeta, natural da ilha da Corvo, residiu e trabalhou na freguesia de Fajãzinha, ilha das Flores, e na cidade de Ponta Delgada, ilha de S. Miguel, tendo vindo a falecer em Lisboa.