É muito provável que o leitor tenha passado pelo jardim de Angra, mais concretamente pelo “jardim de cima”, e nem tenha reparado num busto que lá se encontra, ou, no caso de o ter visto, não conhecer o percurso do personagem ali homenageado. Pois bem, trata-se de Manuel António Lino (1865-1927), médico, professor do liceu, poeta, artista e amante do teatro, entre muitas outras coisas.
Nascido em Angra, no seio de uma família sem grandes recursos, dado que o pai era tanoeiro, estudou no liceu da cidade e partiu depois para Coimbra, onde se bacharelou em Medicina, em 1892. Pelo facto de ter sido um excelente aluno, recebeu prémios em todos os anos da licenciatura, mas recusou o convite para lecionar na Universidade.
Na sua cidade natal abriu consultório de clínica geral e de oftalmologia, mas foi também médico municipal em Angra e na Praia e delegado de saúde do distrito. Perante as ameaças da peste bubónica, fez parte de uma delegação que foi a vários países da Europa estudar a doença. No seu regresso ficou algum tempo no Porto, a combater a epidemia que ali grassava, o que lhe foi muito útil, para o combate da mesma na Terceira, nomeadamente em 1908. Pelo seu espírito abnegado foi várias vezes agraciado.
Para além do exercício da profissão, teve algumas passagens pela área da vida política e administrativa, alinhando com João Franco, quando este fundou o Partido Regenerador Liberal, tendo inclusive feito parte da direção do partido no distrito. Deste modo exerceu o cargo de governador civil na Horta, por apenas 3 meses (1906) e o de vice-presidente da comissão administrativa da Junta Geral (1908). Foi também membro da Comissão de Estudo e Propaganda da Autonomia Administrativa dos Açores (1893).
No liceu, exerceu a docência durante alguns anos (1918-27) das disciplinas de Ciências Naturais e de Química. A paixão pelo teatro levou-o a escrever várias peças, das quais se destacam Rosas e Crisântemos, levada à cena por amadores locais em 1913, e outra, Luz Bendita, apresentada em Angra em 1920, pela companhia de teatro Carlos de Oliveira, de Lisboa. Para além de outras peças mais pequenas da sua autoria, traduziu várias dos principais dramaturgos estrangeiros. Enveredou também pela poesia, tendo publicado dois pequenos livros – Kodaks (1922) e Edelweisse (1925). A sua veia artística revelou-se também na área da música, tendo constituído uma orquestra com instrumentos de corda, muito apreciado na época.
Participantes na peça Rosas e Crisântemos
Orquestra de António Lino
Uma outra paixão que o acompanhou ao longo da vida foi o cultivo de flores, atividade muito frequente na época. Deste passatempo resultaram várias exposições, tendo ficado famosas as de crisântemos que cultivava com todo o esmero.
Exposição de crisântemos na Câmara de Angra
No ano seguinte ao da sua morte, a Junta Geral de Angra resolveu atribuir o “Subsídio dr. Lino”, no valor anual de cinco contos, ao aluno que revelasse aptidões artísticas excecionais e que pretendesse continuar os estudos superiores.
Para lhe prestar a devida homenagem, o presidente da Câmara de Angra, Joaquim Corte-Real e Amaral, decidiu erguer-lhe um busto no jardim, na sequência de um conjunto de melhoramentos que o mesmo presidente havia encetado na parte superior do jardim.
O busto é da autoria de um homem do povo, natural da Ribeirinha, de nome Francisco Matias, e foi descerrado no dia 16 de Outubro de 1949, pelo amigo mais antigo, Manuel Borges d´Ávila. Para além de outros amigos, participaram ainda na cerimónia vários alunos do liceu – Maria Alice Brasil, Maria João Bruges, António Carvão, Maria Armanda Lima e João Manuel Rodrigues – que fizeram a leitura de excertos da obra poética de Manuel António Lino.