MANIFESTAÇÃO DE APOIO À JUNTA REGIONAL
Decorria o mês de Novembro de 1975, no auge dos confrontos políticos entre forças que preconizavam rumos diferentes para Portugal. O país praticamente estava dividido a meio, com a metade Norte contestando a “comuna” de Lisboa e o resto do Sul pintado de vermelho.
(Desfile na Rua do Galo)
Mário Soares e Sá Carneiro haviam precisamente rumado ao Norte, na disposição de transferir para lá o centro do poder político. Uma manifestação em Lisboa liderada pelo Partido Comunista punha em causa o VI Governo provisório dirigido pelo Almirante Pinheiro de Azevedo, exigindo uma nova política para o país, com a expulsão dos reacionários do poder.
(Bandeira da FLA)
Como resposta, a Junta Regional dos Açores, liderada pelo General Altino de Magalhães, decidiu emitir um comunicado no dia 15 de Novembro de 1975, lido na abertura do telejornal pelo vogal Martins Goulart. Nele denunciava os perigos para a instalação de uma ditadura de esquerda ou de direita e exigia que as forças militares e militarizadas fossem o garante das liberdades individuais. Concluiu afirmando que a Junta recusará “toda a governação não representativa e actuante contra a vontade da maioria do Povo”. Perante esta situação de perigo de total anarquia, a Junta Regional dos Açores “toma sobre si a responsabilidade de continuar a “assegurar em quaisquer circunstâncias ao Povo Açoriano a Paz, o Trabalho e as liberdades individuais necessárias a uma via democrática.”
(Concentração na Praça Almeida Garret)
Na sequência deste comunicado, organizaram-se várias manifestações pelas ilhas. A da Terceira assumiu uma feição apartidária, embora seja notório um empenhamento por parte da FLA. Logo no dia seguinte, distribuiu um panfleto apelando a uma manifestação de apoio à Junta. Com o mesmo objetivo, várias organizações sindicais, como o Sindicato dos Caixeiros e Empregados de Escritório, Unicol, Associação Comercial e Industrial, Lacticínios da Ilha Terceira, delegados sindicais da SATA e muitos outros, tomaram também a iniciativa de se manifestarem. A nível dos partidos, PPD e PS desvincularam-se de qualquer apoio, tendo o CDS aderido.
O ponto de encontro foi marcado para junto ao Palácio da Justiça, donde seguiu até ao governo civil. De acordo com a imprensa terão participado cerca de 10 mil pessoas, o que foi considerado a maior manifestação até então realizada. Numerosos cartazes exibiam o sentir dos participantes e as palavras de ordem em voga foram repetidas ao longo do percurso: “Lisboa escuta, os Açores estão em luta”, “Altino amigo, o povo está contigo”,
A intervenção de fundo coube ao Regente Agrícola Gilberto Costa. Acentuou o carácter apartidário e unitário da mobilização e criticou as cúpulas dos dois maiores partidos da Terceira por não terem compreendido que o que estava em causa era a autodeterminação dos Açores. Considerou que “a anarquia reinante no continente, a divisão no seio das Forças Armadas, os campos políticos a extremarem-se não garantem a estabilidade necessária a uma verdadeira autonomia”, estabilidade que acabara de ser prometida pela Junta Regional. Enunciou uma série de princípios de índole democrática acabando com um “Viva os Açores livres”.
Para além de outras intervenções de menor fôlego de elementos conhecidos como ligados à FLA – Roberto da Silva Lourenço, Carlos Jorge Sieuve e Silvério Bispo -, interveio Melo Alves, como representante da Junta Regional. Afirmou que “nós, democratas, aqui reunidos nem precisamos de dizer fora este ou fora aquele – basta que todos demonstrem querer respeitar a ordem e a liberdade dos outros. Este povo porque é democrata não precisa de andar a perseguir comunistas ou a perseguir FLA´s. Desde que uns e outros respeitem o jogo democrático, este povo nada tem contra eles, nem as autoridades nada terão contra eles”.
Mas esta convicção de Melo Alves não refletia o que se vivia no quotidiano. Para além da violência que se havia espalhado por algumas ilhas durante os meses de Verão, nessa mesma madrugada um novo atentado fazia explodir a sede do Partido Socialista em Ponta Delgada.
Uns dias depois, iria desenrolar-se todo o movimento do chamado “25 de Novembro”. Posições extremistas no seio das Forças Armadas precipitaram a saída de tropas coordenadas por Ramalho Eanes que impuseram uma nova ordem. A partir de então, o peso dos comunistas no aparelho do Estado e no seio das Forças Armadas ficou bastante reduzido.
Afastado “o perigo comunista”, nem por isso a sociedade portuguesa acalmou. Apesar de ter arrefecido o calor do Verão Quente de 1975, os conflitos continuaram latentes. Nos Açores, foi-se delineando com clareza a estratégia do reforço da autonomia, com a FLA a perder influência na mobilização das pessoas e a assistir ao afastamento de “apoiantes” que se serviram da conjuntura, apenas, para combater a forte presença dos comunistas na esfera do Poder.
CARLOS ENES
As fotografias são do espólio da FOTAÇOR.