Chesterton
MENINO JESUS ENTRE OS DOUTORES
Mário T Cabral, 2013
37. RETRATOS DE FAMÍLIA
n) CHESTERTON
Tinha mais de metro e noventa e pesava mais de cento e trinta quilos; mas isto é nada comparado com o valor da sua alma; não por acaso, está proposto para beatificação. Certo é Pio XI tê-lo honrado com a Ordem de S. Gregório Magno.
Certa vez perdeu-se a meio de uma viagem, e teve de telegrafar para a mulher, a perguntar onde deveria estar. “Em casa”, respondeu Frances, que era quem lhe dava dinheiro para o autocarro, como a um filho. Amou-a até ao fim; continuam a amar-se no Além.
Felizmente não se perdia nas estradas do espírito, pelo que pode ser comparado a uma águia, ridícula no chão mas sublime nas alturas. O seu raciocínio voa; também faz pensar num dançarino sobre o gelo.
Quem não se lembra do Padre Brown, de batina e guarda-chuva, a encontrar a explicação comezinha dos crimes que investiga, contra as susperstições sobrenaturais das outras personagens?
Enquanto Sherlock Holmes prima pela explicação científica dos mistérios, o simpático Padre centra-se no conhecimento da alma humana e na lógica pura e simples.
“São anos de prática de confessionário”, dirá, em certa história; e em quase todas procura convencer os criminosos a mudar para o lado do Bem, onde uma pessoa pode evoluir.
Está muito traduzido e é urgente ler Ortodoxia e O Homem Eterno, por exemplo. A sua leitura é exercício de graça e inteligência. É mestre no paradoxo como arma contra a aceitação complacente dos lugares comuns, o “politicamente correto”. Prefere chamar-lhe “senso incomum”. Os intelectuais da moda dizem sempre coisas tão sem sentido…
Em síntese, afirma que a Ortodoxia defende a razão do seu desvario e que foi a Igreja, enquanto instituição, quem procurou combinar a razão e a fé. Os homens correm o risco fácil de enlouquecer, devido à razão; e não é o órgão assim doente que os libertará.
A filosofia também insiste nisto, desde Aristóteles: o ponto de partida de qualquer sistema não é demonstrável; trata-se de um axioma, no qual se faz fé, ou não. Fé por fé, antes uma que venha do Céu.
Não aceitar o dogma é entrar no redemoinho relativista, regressão infinita e multiforme, espelhos loucos de feira populista.
Chesterton usa a técnica da redução ao absurdo, que consiste em levar as teses adversárias até ao ridículo. O modo como o faz é quase sempre brilhante. Uma pessoa parte-se a rir.
A ideia de fundo de O Homem Eterno é que no princípio está o Bem e só depois o mal, o inverso do darwinismo. Primeiro, o Paraíso; depois, a Queda; por fim, o Cristianismo.
Isto, sim, é evolução.