T. S. Eliot
Mário T Cabral, 2013
o) T. S. ELIOT
Vale mesmo a pena ouvir T. S. Eliot dizer a sua poesia: há melancolia no registo fonográfico antigo, na voz como que nasalada, na pronúncia que ninguém diria dum americano.
É uma cantilena encantatória, ritmo de exorcismo, oração primeva, réplica do epicentro poético mais remoto, quando não havia fingimento na Arte, mas responsabilidade metafísica pelo des-vendamento da Verdade.
Estamos diante dum dos maiores expoentes do modernismo literário. The Waste Land está para a poesia como Ulisses, de Joyce, para o romance: é o mesmo desespero e desolação do entre-guerras, o mesmo ritmo sincopado do jazz, o mesmo fluxo de consciência, as mesmas mudanças abruptas de narrador, tempo e espaço…
… e a mesma alta escola, a mesma inteligência de primeira, a mesma cultura clássica, com destaque para Dante, pela mão de Ezra Pound. Pode haver igual, mas não há nada superior a isto no séc. XX.
Esta aliança entre a mundividência contemporânea e o fundo erudito deriva, como ele próprio reconhece, de ter nascido na América e de ter vindo estudar para a Europa, onde se naturalizou inglês e se converteu ao “anglicanismo católico” (expressão do próprio).
Quarta-feira de Cinzas é o seu primeiro poema após a conversão, em 1927. Nota-se a diferença: há a esperança na salvação, a ironia desaparece e deixa de haver a disseminação das vozes, entando o poema concentrado num horizonte bem definido.
Muitos críticos não gostaram do tom cristão explícito; a referência a Maria Auxiliadora é constante! A coisa piora em Quatro Quartetos! Se fosse hoje, uma aposta que não ganharia o prémio Nobel, como em 1948?!
Mas as explicações de Eliot não são fáceis de contornar, mesmo para um ateu, esperando que seja culto. Leia-se o ensaio “A Ideia de uma Sociedade Cristã”, por exemplo.
Não se trata apenas de ganhar o Céu — que é o mais importante, como é óbvio! O ponto é que quando não se tem o Zénite se cai no inferno, onde domina o mais forte.
As sociedades democráticas tendem a perder o Zénite, confundindo as elites com poder político. Ora, não é possível qualidade quando não há referenciais de excelência. Os autores sérios acabam a criar para pequenos grupos que não influenciam o tecido social; e os mais populares submetem-se à lógica do lucro e do público sem sentido crítico e iletrado.
O Cristianismo foi e deve voltar a ser o cânone espiritual que, à vez, convoca às mais altas montanhas da criatividade e do valor moral e à libertação da tirania política duma sociedade massificada.