Comunicação de José
Andrade, apresentada na Mesa dos Meios de Comunicação Social do Congresso
Internacional dos 270 Anos da Presença Açoriana em Santa Catarina
Florianópolis, 19 de
abril de 2018
Confesso que fiquei tão
surpreendido e reconhecido, quanto honrado e assustado, com o convite que me
foi dirigido para "representar os Açores" nesta Mesa dos Meios de Comunicação
Social que abre o Congresso Internacional dos 270 Anos da Presença Açoriana em
Santa Catarina.
Surpreendido, porque
muito melhor do que eu aqui estariam tantos e bons nomes ilhéus de referência
nacional que dignificam a comunicação social açoriana nas nossas ilhas e no
continente português.
Assustado, porque
partilho esta mesa temática com personalidades marcantes da comunicação
catarinense, como os influentes colunistas Moacir Pereira e Carlos Damião,
referências incontornáveis do jornalismo estadual associadas aos importantes
jornais "Diário Catarinense" e "Notícias do Dia", sob a coordenação do próprio
presidente da Associação Catarinense de Imprensa, o prestigiado jornalista
Ademir Arnon.
Ainda assim,
reconhecido e honrado com este convite, que ousei aceitar por três pressupostos
simbólicos:
Por ser sócio, há três anos,
do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina;
Por ser profissional,
há três décadas, do Centro Regional dos Açores da Rádio e Televisão de
Portugal;
Por ser herdeiro, há
três gerações, de uma família açoriana dedicada ao jornalismo.
Meu pai, Manuel Jacinto
Andrade, era chefe de redação do mais antigo jornal português, o "Açoriano
Oriental";
Meu avô, Cícero de
Medeiros, foi diretor do jornal "Correio dos Açores" e, depois, fundou e
dirigiu o jornal "Açores".
Curiosamente, o meu
bisavô emigrara para o Brasil e aqui casou com uma jovem brasileira do Estado
do Amazonas, América Alzira de Sousa Medeiros, mas fez questão de voltar à ilha
de São Miguel só para que Cícero nascesse na sua vila do Nordeste, em 1906.
Regressaram prontamente a Manaus, onde o meu avô acabaria por passar as
primeiras duas décadas da sua vida, antes de fixar residência definitiva em
Ponta Delgada e de dedicar as quatro décadas seguintes à inovação do jornalismo
açoriano.
Portanto, com este
sangue brasileiro e jornalístico que me corre nas veias a partir do coração,
proponho-me partilhar aqui alguma informação ilustrativa do percurso histórico
e da realidade presente dos Meios de Comunicação Social no Arquipélago dos
Açores.
( Jornalistas: Carlos Damião,Moacir Pereira,José Andrade e Ademir Arnorn,Presidente da ACI)
Primeiramente, a
IMPRENSA.
A imprensa açoriana
nasce dois anos antes da imprensa catarinense.
O primeiro jornal
publicado nos Açores é a "Folhinha da Terceira", fundado em 1829 na cidade de
Angra do Heroísmo.
O primeiro jornal
publicado em Santa Catarina é "O Catharinense", fundado em 1831 nesta então
cidade do Desterro.
Três anos depois do
pioneiro terceirense dos jornais açorianos, a imprensa chega à ilha de São
Miguel, com a publicação do "Crónica, Semanário dos Açores", em 1832, na cidade
de Ponta Delgada.
E expande-se, depois,
para quase todo o arquipélago: em 1857, com "O Incentivo", na ilha do Faial; em
1866, com "O Futuro", na ilha Graciosa; em 1871, com "O Jorgense", na ilha de
São Jorge; em 1874, com "O Picoense", na ilha do Pico; em 1885, com "O
Mariense" e com "O Florentino", respetivamente, nas ilhas extremas de Santa
Maria e das Flores.
É também em Angra do
Heroísmo que surge o primeiro jornal diário dos Açores, "A Trombeta Açoriana",
em 1886. E é em Ponta Delgada que nasce o primeiro periódico de temática
agrícola publicado em Portugal, "O Agricultor Micaelense", em 1843.
Segundo um estudo que
desenvolvemos sobre "A Imprensa Açoriana do Século XIX", mais de meio milhar de
títulos periódicos são publicados em todas as ilhas e concelhos dos Açores, com
exceção do Corvo, só nas primeiras sete décadas até 1899.
São jornais, boletins e
revistas de caráter político, literário, religioso e humorístico, geralmente
com existência efémera, tiragem reduzida, número mínimo de páginas.
A publicação de 60% dos
jornais oitocentistas surge concentrada nas três cidades açorianas: 186 em
Ponta Delgada, 144 em Angra do Heroísmo, 90 na Horta.
É curioso constatar
que, durante o século XIX, a imprensa açoriana e a imprensa catarinense são
cronologicamente semelhantes, mas quantitativamente diferentes.
O Arquipélago dos
Açores, registando 248.000 habitantes no primeiro recenseamento geral da
população portuguesa realizado em 1864, conta com mais de 500 jornais
publicados no século XIX.
A então Província de
Santa Catarina, registando 158.000 habitantes no primeiro censo brasileiro de
1872, conta com cerca de 160 jornais publicados no século XIX, conforme indica
o Catálogo de Jornais Catarinenses da Fundação Catarinense de Cultura.
Curiosamente, também, a
imprensa açoriana e a imprensa catarinense publicam três dezenas de jornais,
com o mesmo título durante o século XIX, nomeadamente: A Esperança, A
Liberdade, A Lucta, A Luz, A Quinzena, A Regeneração, A Semana, A União, A
Verdade, A Voz, A Voz do Povo, Conciliador, Evolução, O Artista, O Futuro, O
Globo, O Independente, O Patriota, O Progressista, O Progresso, O Santelmo, O
Typographo, Palavra, Pátria, Sul, Vanguarda e Voz da Verdade.
Mesmo 100 anos depois,
no final do século XX – quando a Região Autónoma dos Açores, depois da grande
vaga da emigração açoriana, estabiliza a sua população em cerca de 250.000
habitantes – a imprensa das nossas ilhas é ainda proporcionalmente
significativa.
Até à década passada,
chegámos a ter 7 jornais diários, quase todos centenários, com publicação
simultânea em 3 cidades: os matutinos "Açoriano Oriental" e "Correio dos
Açores" e o vespertino "Diário dos Açores" em Ponta Delgada; o matutino "Diário
Insular" e o vespertino "A União" em Angra do Heroísmo; o matutino "O
Telégrafo" e o vespertino "Correio da Horta" na cidade da Horta.
O Estado de Santa
Catarina – que cresce, entretanto, para cerca de seis milhões de habitantes –
tem então quatro dezenas de publicações diárias, segundo informação da
Associação Nacional de Jornais.
Já nesta segunda década
do século XXI, a imprensa generalista açoriana conta agora com 15 títulos
principais em quatro ilhas: 7 em São Miguel, 4 no Pico, 2 na Terceira e 2 no
Faial.
Na ilha de São Miguel,
que regista mais de metade da população dos Açores, a cidade de Ponta Delgada
mantém a publicação de três jornais diários de referência histórica: o
"Açoriano Oriental", fundado em 1835 e diário desde 1979, que é o jornal mais
antigo de Portugal e o segundo mais antigo da Europa em publicação
ininterrupta; o "Diário dos Açores", fundado em 1870, que é o quotidiano mais
antigo do arquipélago; o "Correio dos Açores", fundado em 1920.
Também em Ponta Delgada
são editados o jornal semanal "Atlântico Expresso" e as revistas mensais "NO" e
"Criativa", enquanto o semanário "A Crença" é publicado em Vila Franca do Campo
desde 1915.
A ilha do Pico, com
menos de 15.000 habitantes, mantém três semanários nos três concelhos – o
centenário "O Dever" na vila das Lajes, o "Ilha Maior" na vila da Madalena e o
"Jornal do Pico" na vila de São Roque – para além de editar a revista mensal
"Triângulo Magazine", comum às ilhas de São Jorge e do Faial.
No Faial, a cidade da
Horta retomou em 2004 a publicação diária do seu primeiro jornal "Incentivo" e
assegura a edição do semanário "Tribuna das Ilhas".
Na ilha Terceira, a
cidade de Angra do Heroísmo publica o "Diário Insular" desde 1946, enquanto a
cidade da Praia da Vitória edita quinzenalmente o "Jornal da Praia".
Por curiosidade final,
se compararmos os dois jornais de maior circulação nos Açores e em Santa Catarina,
temos que o "Açoriano Oriental", publicado há 183 anos em Ponta Delgada,
imprime diariamente 5.000 exemplares para uma ilha com 150 mil habitantes, e
que o "Diário Catarinense", editado há 32 anos em Florianópolis, regista uma
tiragem de 19.000 exemplares para um estado com seis milhões de residentes.
Assim se resumem os
dois séculos da imprensa açoriana.
Seguidamente, a RÁDIO.
Mais recente e, portanto, mais breve.
De acordo com as
informações recolhidas para o livro "Aqui Portugal – Os Primeiros Anos da
Telefonia nos Açores", que publicámos em 2003 e reeditámos em 2016, a primeira
transmissão açoriana de Telegrafia Sem Fios ocorre exatamente há 90 anos, em
1928, na cidade de Ponta Delgada, por iniciativa pessoal de Jacinto Pedro
Ribeiro.
Quatro anos depois, em
1932, nasce a primeira rádio fundada no Estado de Santa Catarina e uma das mais
antigas do Brasil, o Rádio Clube de Blumenau, sendo que atualmente o Estado
conta com cerca de 280 emissoras de radiodifusão.
Os Açores, durante os
anos 30, registam uma dezena de postos privados de radiodifusão: sete em Ponta
Delgada e três nas ilhas Terceira, Faial e São Jorge.
No ano de 1941, em
plena Segunda Guerra Mundial, o governo português do Estado Novo, por afirmação
nacionalista e estratégica militar, instala em Ponta Delgada o Emissor Regional
dos Açores da Emissora Nacional.
Nasce assim, há 77
anos, o serviço público regional da Radiodifusão Portuguesa, que integra agora
a RTP/Açores, com estúdios próprios nas ilhas de São Miguel, Terceira e Faial.
São suas contemporâneas
as mais antigas rádios privadas dos Açores ainda em atividade – o Clube Asas do
Atlântico, fundado na ilha de Santa Maria em 1947, e o Rádio Clube de Angra,
criado em 1949 na ilha Terceira – para além da Rádio Lajes, a voz da Força
Aérea Portuguesa na Base das Lajes desde há 71 anos.
Agora, existem cerca de
30 rádios locais nos 19 concelhos das 9 ilhas dos Açores, de entre as quais uma
dezena com mais de duas décadas: a Rádio Antena 9 (1986), a Rádio Nova Cidade
(1986), a Rádio Horizonte (1987), a Rádio Atlântida (1988), a Rádio Graciosa
(1988), a Rádio Pico (1988), a Top Rádio (1988), a Rádio Lumena (1989), a Rádio
Açores TSF (1996).
Finalmente, a
TELEVISÃO.
O Centro Regional dos
Açores da Radio Televisão Portuguesa (RTP) foi inaugurado em Ponta Delgada no
ano de 1975.
Dezoito anos depois do
início das emissões regulares no continente português e passados três anos
sobre a primeira emissão regional no vizinho arquipélago da Madeira, a
televisão chega aos Açores em pleno "verão quente" de 75, marcado por
manifestações populares que mobilizam a ilha de São Miguel sob o signo do
independentismo açoriano.
Em Santa Catarina, a
televisão chegara 11 anos antes, com a "TV Florianópolis" fundada em 1964. E
constam que hoje funcionam, em todo o Estado, cerca de três dezenas de
emissoras locais de televisão.
Nos Açores, a RTP foi o
único meio televisivo durante duas décadas, mas, com a criação da "Cabo TV
Açoreana" em 1994, passou a partilhar os televisores insulares com mais de duas
centenas de canais, incluindo os brasileiros Globo e Record.
Já longe vai o tempo em
que "Gabriela Cravo e Canela" concentrava a atenção dos açorianos de todas as
ilhas.
Hoje, para além da
televisão, da rádio e dos jornais, são as redes sociais que predominam também
nos Açores.
Através da Internet,
temos não apenas a versão digital dos órgãos convencionais de comunicação
social, mas também jornais, rádios e televisões com difusão exclusivamente
online.
270 anos depois,
estamos agora à distância de um clique.
O Arquipélago dos
Açores ajudou a escrever a história do Sul do Brasil.
A Região Autónoma dos
Açores está oficialmente irmanada com o Estado de Santa Catarina.
Ponta Delgada, como
Angra do Heroísmo e Praia da Vitória, é cidade-irmã de Florianópolis.
Temos todas as razões
para sermos mais próximos.
As novas tecnologias
facilitam, cada vez mais, isso mesmo.
Podíamos então dar um
primeiro passo nessa caminhada de conveniência mútua, criando um jornal digital
conjunto de Açores e Santa Catarina, para partilhar notícias de interesse comum
a partir de Ponta Delgada e Florianópolis.
Poderia até
intitular-se "Açorianópolis", o termo criado pelo Professor Nereu do Vale
Pereira, em homenagem ao decano atual das históricas relações entre açorianos e
catarinenses.
Esta Mesa, neste
Congresso, é um excelente ponto de partida.
E esta semana, nesta
cidade, foi assinado um protocolo de cooperação, entre a Associação Catarinense
de Imprensa e o Município de Ponta Delgada, que bem pode conferir enquadramento
institucional a esta iniciativa.
Aqui fica a nossa
sugestão e a nossa disponibilidade.