“Julieta vive hoje num 25ª andar… Já não há Romeu”…
Leo Ferré
Vivemos numa época em que, manifestamente, o amor não está na moda. E isto porque
ele tende a desvanecer-se na vertigem do nosso quotidiano, dominados que estamos pelo social,
pelo político, pelo económico e pelo pragmático.
ele tende a desvanecer-se na vertigem do nosso quotidiano, dominados que estamos pelo social,
pelo político, pelo económico e pelo pragmático.
O amor está cada vez mais banalizado e estereotipado pelos media. Vamos perdendo, a
pouco e pouco, o sentido do sonho e da utopia e o resultado salta à vista: assiste-se hoje à
indiferença, ao amesquinhamento e à repressão que os diversos poderes vão, propositadamente,
lançando sobre tudo o que seja afecto, amor, sentimento, paixão…
pouco e pouco, o sentido do sonho e da utopia e o resultado salta à vista: assiste-se hoje à
indiferença, ao amesquinhamento e à repressão que os diversos poderes vão, propositadamente,
lançando sobre tudo o que seja afecto, amor, sentimento, paixão…
Por outro lado, as linguagens teóricas depreciam o sentimento amoroso. E, como se isto
não bastasse, o sujeito apaixonado é desprezado e assimilado a um lunático…
não bastasse, o sujeito apaixonado é desprezado e assimilado a um lunático…
Em estado de “isolamento social”, deu-me para reler Fragmentos de um Discurso Amoroso
(1977), de Roland Barthes, autor muito em voga nos meus tempos de Faculdade de Letras de
Lisboa.
(1977), de Roland Barthes, autor muito em voga nos meus tempos de Faculdade de Letras de
Lisboa.
Segundo aquele semiólogo francês, o provérbio mente: o amor não é cego. Pelo contrário,
tem um incrível poder de decifração, que tem a ver com o elemento paranóico existente em todo
o apaixonado, que conjuga aspectos de neurose e psicose. Ou seja, o apaixonado é um
atormentado, um louco. Vê claro. Mas o resultado é muitas vezes o mesmo como se estivesse
cego.
tem um incrível poder de decifração, que tem a ver com o elemento paranóico existente em todo
o apaixonado, que conjuga aspectos de neurose e psicose. Ou seja, o apaixonado é um
atormentado, um louco. Vê claro. Mas o resultado é muitas vezes o mesmo como se estivesse
cego.
Já não temos a morfologia do apaixonado, dos seus traços, das suas expressões, da sua
mímica arrebatada e enlevada. No século XIX havia centenas de litografias, pinturas e gravuras que
o representavam, mas hoje temos alguma dificuldade em reconhecer um apaixonado na rua…
mímica arrebatada e enlevada. No século XIX havia centenas de litografias, pinturas e gravuras que
o representavam, mas hoje temos alguma dificuldade em reconhecer um apaixonado na rua…
Perguntar-se-á: o que fica do apelo daqueles antigos postais eróticos que faziam as delícias
dos nossos avoengos? Talvez a possibilidade de redescoberta, ou melhor ainda, da reinvenção do
erotismo que é sempre possível enquanto houver homens e mulheres. Afinal de contas, a razão
permanece do lado dos poetas, que sabem que o erotismo não deve perder-se na febre
mercantilista, antes precisa de se redescobrir como arte maior.
dos nossos avoengos? Talvez a possibilidade de redescoberta, ou melhor ainda, da reinvenção do
erotismo que é sempre possível enquanto houver homens e mulheres. Afinal de contas, a razão
permanece do lado dos poetas, que sabem que o erotismo não deve perder-se na febre
mercantilista, antes precisa de se redescobrir como arte maior.
Com efeito, nos tempos que correm, o erotismo adquiriu uma dimensão consumista que o
vulgarizou e lhe retirou parte do encanto. Isto é, deixou de ser sinónimo de “paixão amorosa” e
“amor lascivo”, como consta nos dicionários, para se tornar em mais um elemento de compra e
venda. A utilização do erótico na publicidade é de há muito um dado adquirido: as mais íntimas
imagens do corpo servem atualmente para ajudar a vender tanto eletrodomésticos como
shampôs…
vulgarizou e lhe retirou parte do encanto. Isto é, deixou de ser sinónimo de “paixão amorosa” e
“amor lascivo”, como consta nos dicionários, para se tornar em mais um elemento de compra e
venda. A utilização do erótico na publicidade é de há muito um dado adquirido: as mais íntimas
imagens do corpo servem atualmente para ajudar a vender tanto eletrodomésticos como
shampôs…
Se o discurso amoroso não está na moda, o amor romântico muito menos. Basta aqui dizer
que os nossos jovens preferem o uso do verbo “curtir” do que o verbo “amar”… É que, hoje, são
outras as componentes semânticas: sexualidade, intimidade, prazer, sedução, sensualidade,
desejo…
que os nossos jovens preferem o uso do verbo “curtir” do que o verbo “amar”… É que, hoje, são
outras as componentes semânticas: sexualidade, intimidade, prazer, sedução, sensualidade,
desejo…
Longe vão os tempos em que os prazeres da vida foram condenados a partir do Concílio de
Trento… A moral católica alertava para os inimigos da alma (o mundo, o diabo e a carne) e
estabelecia os sete pecados mortais (soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça),
reduzindo o sexo a uma mera atividade reprodutora. Como explicava no século XIX o filósofo
“maldito” Wilhelm Reich, tornava-se necessário fazer do sexo e do erotismo um verdadeiro tabu,
para que os imperativos económicos do feudalismo pudessem vingar: menos tempo para o amor
significava mais tempo para o trabalho – assim acreditavam os grandes senhores. Em vez de fonte
de prazer, o sexo e seus derivados eram encarados como a razão de todos os males – aliás, de
acordo com o princípio do pecado original, sem o qual a Humanidade nunca teria chegado a
existir.
Trento… A moral católica alertava para os inimigos da alma (o mundo, o diabo e a carne) e
estabelecia os sete pecados mortais (soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça),
reduzindo o sexo a uma mera atividade reprodutora. Como explicava no século XIX o filósofo
“maldito” Wilhelm Reich, tornava-se necessário fazer do sexo e do erotismo um verdadeiro tabu,
para que os imperativos económicos do feudalismo pudessem vingar: menos tempo para o amor
significava mais tempo para o trabalho – assim acreditavam os grandes senhores. Em vez de fonte
de prazer, o sexo e seus derivados eram encarados como a razão de todos os males – aliás, de
acordo com o princípio do pecado original, sem o qual a Humanidade nunca teria chegado a
existir.
Por conseguinte, não é de agora a confusão entre amor e sexo. Ontem como hoje, parece
prevalecer aquela máxima anglo-saxónica que diz que “tudo o que é bom na vida ou é imoral, ou é
ilegal ou engorda”…
prevalecer aquela máxima anglo-saxónica que diz que “tudo o que é bom na vida ou é imoral, ou é
ilegal ou engorda”…