Naquele tempo praticávamos a sericicultura sem sabermos o que era a sericicultura.
O que os meus irmãos e eu fazíamos era criar, com dedicação e entusiasmo, bichos-da-seda em caixas de papelão e, para os alimentar, íamos para o Monte da Ajuda apanhar folhas deamoreira.
Numa época sem tecnologias da informação e comunicação, aprendíamos ciência ao vivo observando, sem pressas, o mistério que envolve o ciclo de vida do bicho-da-seda.
Primeiro eram as centenas de minúsculos ovos cinzentos (guardados em caixas de sapatos desde o ano anterior) que depois saíam do período de latência e eclodiam. Víamos, com espanto, as lagartas saindo dos ovos e já em busca de comida.
Os bichos-da-seda comiam vorazmente as folhas de amoreira, cresciam rapidamente (chegando a medir 6 cm), e era uma trabalheira estar sempre a colocar novas folhas, recolher os abundantes excrementos e limpar as caixas…
As lagartas trocavam então de pele e, prestes a passar por metamorfose, teciam em volta de si mesmas, com dotes de artesãs, casulos de protecção… Casulos de um amarelo lindo!
Ficávamos dias e dias, horas e horas a observar, fascinados, aquela magnífica operação. No interior do casulo o corpo da lagarta transformava-se, formando-se a crisálida, num processo que durava mais de uma semana até à formação do indivíduo adulto – a borboleta. Esta colocava os ovos, fechando-se assim o ciclo de vida.
Naquele tempo estávamos longe de imaginar que a fibra leve e suave dos casulos se tornaria matéria-prima para a fabricação da seda… E, vivendo nos limites estreitos de uma pequena e graciosa ilha, desconhecíamos de todo a indústria têxtil.
Éramos crianças e o que queríamos era brincar. Ao fazê-lo, despertávamos para a vida, para conhecimento do mundo e das coisas. Era o “saber de experiência feito” em todo o seu esplendor e singeleza. E, à nossa maneira, éramos felizes.