Agora que estou a chegar ao outono da minha vida, chateia-me profundamente o politicamente correcto.
Os poderes, todos os poderes, zelam sempre pelo politicamente correcto. Sim, vivemos no reino do politicamente correcto, a todos os níveis. Por exemplo, na literatura: os protagonistas dos romances contemporâneos são sempre pessoas cheias de bondade e amabilidade, liberais, feministas e defensores do ambiente e dos animais… Imaculados, bebem Don Pérignon, comem Vichyssoise, nunca fazem coisas más, representam sempre as minorias e, sempre que possível, salvam baleias…
Nos dias que correm há quem goste de decidir pelos outros e, hipocritamente, se arvore em moralista e opinador de serviço, com instintos e intuitos normalizadores e policiais. Cresce o receio generalizado em assumir diferenças. Há que ser português suave, manter a descrição e os brandos costumes, bola baixa e nada de fazer ondas… O politicamente correcto tornou-se uma autêntica censura e não permite espaços para o humor. Para quem, como eu, também se movimenta na área da comédia teatral, ao mínimo descuido somos logo apelidados de racistas, homofóbicos, machistas e preconceituosos…
Que os conservadores nos queiram impor regras estipuladas é coisa de sempre e a que os meus 62 anos de idade de há muito se habituaram, eu que ainda vivi 16 anos da minha vida em plena ditadura…
Mas a ditadura agora é outra. É a ditadura do gosto. Do gosto massificado. E o que verdadeiramente me espanta são as ideias tribalizadas e fundamentalistas dos mais jovens que têm muita dificuldade em aceitar ideias que não coincidam com as deles. Ainda um destes dias fui alvo de gozo e chacota ao dizer que não gostava de “suchy”… E lançaram-me olhares desconfiados e sobrolhos franzidos por assumir a minha preferência por um bom bife…
Não vejo grande futuro na juventude. (Ora aqui está uma frase que não é politicamente correcta…). Refiro-me àqueles jovens frívolos e irresolutos, vazios de ideias, dependentes das redes sociais e destituídos de pensamento crítico, que apenas sabem comunicar por smiles e emojis…
Estou também a falar daqueles jovens adultos que não se interessam por uma verdadeira cidadania ativa, viram as costas à “Polis”, não votam, fazendo orelhas moucas (que, já se sabe, estão sempre ligadas aos telemóveis) à lição de Platão: “O castigo por não quereres participar na política é acabares governado por pessoas piores do que tu”…
Resultado: ficam, assim, reunidas as condições essenciais para o surgimento de fenómenos como os populismos, os fundamentalismos (que não são apenas os islâmicos), a corrupção, a judicialização da política, a politização da justiça, e tantas outras desgraças que andam por aí à solta…